A forma mais antiga de se conhecer histórias é através da oralidade, a história ouvida pela sua avó, cuja sua bisavó contou-lhe e que hoje sua mãe lhe conta. Talvez não tenha nenhum registro escrito, você não irá até sua estante pegar um diário e ler em voz alta as histórias de centenas de anos atrás, mas nem por isso você deixará de conhecer e encantar-se por aqueles mitos, contos, ritos e ensinamentos. Talvez, naquela época sua bisavó sequer soubesse escrever, mas não é por isso que lhe faltavam as palavras e, não por isso sua história não era ouvida e repassada por gerações. A verdade é que, para conhecermos uma história não precisamos da letra (escrita), mas sim da palavra (falada).
A tradição oral tem a função de preservar histórias, de garantir às novas gerações o conhecimento de seus antepassados. Para muitos grupos a oralidade é a única forma de resgatar e preservar sua ancestralidade. Hoje, mais de um milhão de brasileiros não possuem o português como sua língua materna. Temos mais de 200 línguas em nosso território, onde muitas são indígenas e não possuem qualquer tradição escrita. Essas línguas e dialetos aos poucos vêm se perdendo. A cada ano a preservação pelas novas gerações tem se tornado um desafio maior.
Atualmente, milhares de brasileiros com ancestrais afro-brasileiros e indígenas desconhecem sua própria história ou acreditam não ter uma de fato.
Refletindo sobre essa situação a TV Cidade Taubaté e a Caipira Filmes, produtora independente de Taubaté, através de sua gestora Cláudia Mello, vem trabalhando já a algum tempo, a oralidade como pilar de preservação da cultura popular da região do Vale do Paraíba Paulista, colhendo depoimentos de pessoas importantes para a manutenção da identidade de um povo formado por cerca de 2,6 milhões de pessoas ( segundo o IBGE em 2021).
Esse trabalho, originou uma série intitulada Vale Saber do Vale, que, com o apoio da Secretaria Estadual de Economia Criativa, através do PROAC LAB 58 ID 3337, foi ampliado, e lançado no Youtube para que todos possa ter acesso, baixar e fazer uso dos ensinamentos nele contidos.
Disponível desde 10 de novembro de 2021, nas redes sociais da Rede Cidade de Comunicação e Cidadania – TV Cidade Taubaté, acessando https://www.youtube.com/c/tvcidadetaubateoficial/videos, o público encontrará a série onde as figureiras Dona Luísa e Dona Cândida estão contando as origens da modelagem argila e do surgimento do pavão azul, Eduardo Leisan fala e mostra como era feita a retirada sustentável de argila do rio Itaim, Mestre Benedicto dos Santos conta suas histórias ancestrais no congado, Ditão Virgílio de São Luiz do Paraitinga fala de Saci, Mestre Gil de Piquete fala de Jongo, Mestre Paizinho fala sobre os significados dos elementos do Moçambique, Ocílio Ferraz e Conceição Molinaro (ambos in memorian) nos deixaram ensinamentos sobre a culinária tradicional a base de milho, Gonçalo Monteiro de Santo Antônio do Pinhal fala da saúde que vem das plantas, Moreno Overá discorre sobre a viola caipira, origens, toques e conceitos, Sr. Manezinho de São Bento do Sapucaí, o último tropeiro vivo que ainda hoje vive de tropa ( transporte em lombo de muares), a benzedeira Dona Nazaré Vitor nos ensina sobre a fé nas rezas e nas ervas, Sr. Belarmino ( Tio Belo – in memorian), nos ensinou em que bairros de Taubaté as manifestações de cultura afro se iniciaram e quem foram os precursores, Mestre Waldomiro nos dá todo o sentido das folias de reis, professor André Luiz que discorre sobre a influência de São Benedito na fé do povo valeparaibano, na simplicidade brejeira do Mestre Renô Martins de Catuçaba aprendemos sobre o canto de mutirão – Brão, e por fim o importantíssimo depoimento do Mestre Luizinho sobre a criação do Maracacongo e as influências africanas na fé, na música, nas danças e nos instrumentos.
As pesquisas acerca da oralidade como preservação de usos, costumes, saberes e fazeres dessa região do Brasil não cessarão por aqui, continuaremos atuando para dar voz ao patrimônio imaterial que as falas de mestres, griôs, tuxauas representam para a cultura de um povo.
Acreditamos no poder da palavra para saber quem fomos, construir quem somos, e melhorar quem seremos, além de deixarmos parâmetros identitários para as futuras gerações.