Em agosto de 2017, o fundador da comunidade Canção Nova, Monsenhor Jonas Abib, fez-me a proposta de viver uma experiência missionária em Moçambique, junto aos salesianos que estão ao norte do país, na Província de Tete. Aceitei o desafio e embarquei para África.
No ano de 2018, inserimo-nos na missão da paróquia São João Batista, na Vila de Moatize, na diocese de Tete, que conta com uma rádio comunitária. Essa paróquia possui trinta comunidades e algumas das aldeias atendidas estão a 100 km da sede. Ali desenvolvemos nossos trabalhos junto aos missionários salesianos.
Já em 2019, eu e o missionário leigo Cristian Boher nos inserimos na missão da paróquia Nossa Senhora da Conceição, na Aldeia do Zobué, na fronteira com o Malawi. Uma igreja que estava há quase 20 anos sem padre residente, recebia ajuda pastoral dos salesianos que vinham da paróquia vizinha, a 100 km.
Defrontamo-nos com muitos desafios missionários. Enfrentamos a realidade da inculturação e da adaptação em uma cultura tribal. O idioma oficial de Moçambique é o português, porém existem no país mais de 20 dialetos falados nas diversas etnias. Nas zonas rurais e aldeias não se fala o português, somente dialeto. São os desafios culturais que todos vivem ao se dispor a viver a missão ad gentes.
Estamos na realidade de um país em processo de evangelização, no qual, em muitos lugares, o Evangelho não foi anunciado. Nas aldeias, muitos ainda não conhecem Jesus Cristo, e também faltam missionários. Na Diocese de Tete, oito, das 28 paróquias, estão sem padres. Em Moçambique, as religiões tradicionais são muito fortes, e nós respeitamos. É preciso entender a cultura para evangelizar sem ferir as raízes do povo. É um processo lento, que requer muita paciência.
Temos também os desafios da pobreza e desigualdade social. Moçambique, apesar do desenvolvimento econômico dos últimos anos, continua a ser um dos países mais pobres do mundo. Vemos ainda muita fome e miséria, pessoas que têm apenas uma refeição por dia. Com os problemas do sistema de saúde precário, muitas pessoas morrem de malária e AIDS. São inúmeros os problemas na área da educação, escolas degradadas e falta de infraestrutura.
Ao nos depararmos com tudo isso, nos sentimos pequenos, insuficientes e incapazes. Mas, em Deus, colocamos nossa “gota d’água” nesse oceano infinito de necessidades. Temos atendido e celebrado com o povo de Deus: missas, confissões, batizados, exéquias, matrimônios; buscado orientar e formar os jovens.
Fazemos missão nas aldeias, mesmo sem falar o dialeto local. Um tradutor local nos auxilia em tudo. Quando sobra algum tempo livre, tentamos ajudar um pouco no cuidado das crianças que ficam a todo momento no quintal da casa paroquial. Recebemos mais do que damos ao povo!
Um povo pobre, porém generoso, alegre, acolhedor, que celebra tudo. O canto e a dança nos contagiam. Apesar de não entendermos o dialeto, cantam algo que parece já estar em nossa alma.
Eles nos ensinam como realmente devemos viver e celebrar cada momento, principalmente a Santa Missa. Não vi isso em nenhum lugar do mundo. Não restringem horários para Deus, por exemplo, não têm horário para terminar a missa, duas a três horas é pouco pois continuam lá louvando e cantando ao Senhor. Assim, é o povo da África!
Temos vivenciado com muita alegria os desafios desta missão que nos faz crescer humana e espiritualmente com a cultura desse povo. E assim, com a graça da Divina Providência, continuamos a cantar uma Canção Nova no continente africano.
* Padre Ademir Costa da Silva é missionário da Comunidade Canção Nova. Atualmente está na Aldeia de Zobué, Província de Tete, Moçambique