Especialistas explicam que as contratações já feitas para uso obrigatório de termelétricas pelos próximos três anos continuarão pressionando o preço da tarifa de energia
Apesar da melhora nos níveis dos reservatórios do país e da diminuição, ao menos até o momento, do uso das termelétricas, as perspectivas para o consumidor em relação à redução da conta de energia não são boas.
Segundo especialistas ouvidos pela CNN, os brasileiros podem esperar, a partir de maio, o fim da tarifa de escassez hídrica — a mais alta de todas, com custo de R$ 14,20 a cada 100 KWh consumidos.
No entanto, a conta final de luz a ser paga não deve sofrer impactos significativos e vai continuar cara, mesmo com o fim da bandeira tarifária.
Isso porque, segundo os especialistas, ao longo da crise hídrica do ano passado, o governo federal fez contratações emergenciais bilionárias para o uso de termelétricas, que entrarão em operação a partir de maio deste ano até dezembro de 2025.
Ou seja, essa conta ainda será repassada para os consumidores finais durante todo esse período. As contratações emergenciais já somam cerca de R$ 11,7 bilhões.
Segundo o professor de planejamento energético da UFRJ, Diego Malagueta, a boa notícia é que o cenário hídrico atual traz segurança energética. Isso significa que não há riscos de racionamentos ou cortes de energia, como houve ao longo da crise do ano passado.
Porém, o professor afirma que mesmo com os atuais níveis nos reservatórios, as térmicas, a partir do mês que vem e até dezembro de 2025, serão usadas prioritariamente.
“Apesar de níveis melhores e com as térmicas sendo menos acionadas neste momento, no auge da crise o governo determinou a compra de termelétricas de emergência para a geração de uma grande quantidade de energia, por efeito de lei. Sendo assim, mesmo tendo chovido muito, essa geração mais cara (de térmicas) vai entrar. Ou seja: a tarifa vai continuar mais alta do que indicam os reservatórios”, explicou Malagueta.
Atualmente, os reservatórios do Sudeste/Centro-Oeste estão com 64,50% de sua capacidade, maior nível desde 2013. Já os reservatórios do Nordeste estão com 96,65% de sua capacidade e os do subsistema Norte com 98,59%.
O professor ainda explicou que o que pagamos a mais nesse período de bandeira de escassez hídrica em vigor ainda não foi o suficiente para suprir todo os custos das distribuidoras de energia.
Ele diz que os efeitos desta contratação (2022 a 2025) serão ainda mais sentidos entre os anos de 2023 e 2026. Isso porque as distribuidoras só repassam os aumentos aos consumidores uma vez por ano.
“As distribuidoras não podem repassar todos os custos para os consumidores de uma só vez. Sendo assim, acabamos pagando esse valor com juros e essa conta ainda não fechou”, apontou.
O consultor do Instituto Clima e Sociedade e ex-diretor geral do Operador Nacional do Sistema (ONS), Luiz Eduardo Barata, também corrobora com as projeções pessimistas em relação ao valor da conta de luz paga pelos brasileiros.
“Apesar das condições muito boas dos reservatórios, tivemos uma conta passada enorme. ‘Conta Covid’ para ser paga, novo empréstimo que foi realizado, e uma contratação de usinas térmicas mais caras”, disse.
“Então, apesar das boas condições, nós tivemos contratações, em especial a feita em outubro, que vão apresentar um custo de 39 bilhões em três anos. A conta vai continuar sendo cara por um bom tempo”, acrescentou.
Outro fator que deve incidir nas altas tarifas pagas pelo consumidor é o aumento do custo do preço dos combustíveis, principalmente em decorrência da guerra na Ucrânia, como explica Diogo Lisbona, especialista em energia elétrica e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
“A geração termelétrica hoje vai enfrentar um custo mais elevado do que no começo do ano passado. Com a guerra da Ucrânia, o preço do petróleo e gás natural estão lá em cima. A Europa terá que reduzir a dependência do gás russo e vai pressionar o preço em vários hubs de gás. Em várias dessas termelétricas aqui no Brasil o preço do combustível é indexado aos custos de geração, que tende a ser ainda mais custosa”, avaliou Lisbona.
O especialista também lembrou que as tarifas de energia têm crescido acima da inflação, o que pesa ainda mais no bolso dos consumidores, especialmente nos extratos sociais de menor renda.
A conta de luz é composta por tarifas definidas e regulamentadas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). São os impostos, encargos setoriais, custos de geração, transmissão e distribuição de energia.
Já as tarifas são acréscimos à conta de luz usados para compensar e equilibrar os custos das distribuidoras, como é o caso da bandeira de escassez hídrica.