A experiência das duas grandes guerras e o advento do fascismo representam acontecimentos fundamentais para entendermos o perfil de alguns dos maiores poetas do Novecentos italiano. No caso de Giuseppe Ungaretti (1888-1970), sua participação como soldado na primeira guerra mundial alimentou um dos mais radicais exemplos de renovação formal vivido pela lírica italiana, embora existam outros aspectos – dentre os quais, o convívio do autor com o meio artístico de Paris , para onde se mudou em 1912, e a amizade com Apollinaire, Picasso, Cendrars e De Chirico – que nortearam a criação de uma dicção descarnada, altamente evocativa, composta por versos breves jogados no fundo da página branca como se fossem súbitos sinais de morte sobre o abismo do silêncio.
De fato,a poesia de Ungaretti incluída no livro Alegria corresponde ao manifesto de uma tragédia pessoal e coletiva, no qual a referência a determinadas experiências é reduzida a elementos essenciais e originários, mais evocados do que relatados. No entanto, outros elementos biográficos desempenharão um papel importante na construção da obra do autor; Ungaretti nasceu no Egito, morou em Paris, antes e depois da Primeira Guerra Mundial, casou-se com a francesa Jeanne Dupoix. Além disso, foi convidado para lecionar em várias cidades da Europa e, entre 1936 e 1942, foi professor de literatura italiana na Universidade de São Paulo, período marcado pela dolorosa perda, em 1939, do filho Antonietto.
A experiência de estar fora do lugar de origem da própria cultura também provocou, além do contato com outras tradições culturais, um efeito de impacto e de renovação dentro da tradição italiana.
O poeta exerceu, juntamente com Montale, uma influência capital nas gerações futuras na Itália, inclusive pelo fato de introduzir no panorama cultural do seu país tendências líricas advindas de outros horizontes.
A produção de Ungaretti posterior a Alegria (em Sentimento Del tempo, de 1933; Il dolore, de 1947; La terra promessa, de 1950; Um grido e paesaggi, de 1952; Il taccuino Del Vecchio, de 1960 e Il deserto e dopo, de 1961) está centrada no binômio vida/morte, numa celebração do estupor diante da manifestação da vida sob a ameaça constante da morte.
Prof. José Pereira da Silva