Era uma vez três porquinhos, vivendo no mesmo sítio, comendo os mesmos alimentos, obedecendo ao mesmo pai. Na escola da fazenda, o professor Porcácio, ensinava ler, escrever, fazer as operações matemáticas comuns à vida; ao mesmo momento, falava em planejamento, previsão durante o tempo, uso da inteligência, e muito trabalho.
O porquinho chamado Prático Messias da Bolsa, pois usava uma espécie de mochila, dia e noite, nas costas, ela confundia-se com seu corpo, tentou planejar a sua vida. Estudar o mundo, o solo onde pisamos, as ações que praticamos, era muito para ele. O pobre tentou ler Platão, mas acabou confundindo os pensamentos do filósofo, com um prato grande, contendo inúmeros alimentos impossíveis de serem digeridos.
Andando por estradas retas, curvas, circulares, acabou matriculado na cavalaria que protegia os sítios, as fazendas, os latifúndios, os empresários e, de vez em quando os necessitados.
Ficou orgulhoso quando recebeu a sua armadura, lança, escudo, arco e flecha. Treinou pulo à distância, correr nos campos, entrar nas florestas, atravessar riachos.
Os seus dois irmãos lançavam-se na vida; um abriu uma fabriqueta de picolé de ração; o outro, um armazém estocado com todos os objetos necessários à vida dos porcos.
O porquinho Prático Messias Bolsa sofria, sem saber, da síndrome de Hércules, vivia num mundo fantasioso lotado de grandes heróis, atletas, seres messiânicos, amor, sedução, amantes, noitadas, madrugadas, motos, carros, voos nas costas dos abutres mais resistentes. O seu outro lado neurótico, muito raramente, via a realidade da vida, a simplicidade, a ordenação das ideias, as soluções. O resultado foi bem triste, foi mandado embora da cavalaria.
Prático Messias caminhou as suas noites, casou e descasou, casou novamente e descasou novamente, casou mais uma vez para não perder o costume, descasou para quebrar o cotidiano, e, quando percebeu, tinha uma prole.
Procurou vários empregos; todos exigiam pessoas sem síndromes aparentes. Resolveu, dentro de um movimento surtado, entrar na política, candidatando-se a “de-putado”, pelo partido P.U.S – Porcos Unidos Sensatos. Foi eleito, assumiu um pedacinho do sítio. A partir desse movimento, pronunciou frases politicamente alucinadas. Nunca fez nada, não escreveu projetos significativos, não defendeu teses arrojadas, mas tornou-se um poeta. Suas poesias vinham da alma, demonstrava um amor erótico por armas; um desejo por tortura, violência, guerra civil, mortes, torturadores, masculinidade; para várias a temática, escrevia longos poemas contra os gays, índios, negros, opositores, mulheres metidas em política. O seu interior era possuído e dominado pelo Id, não respeitava o superego, e o ego trocava de roupa várias vezes ao dia; uma hora era arlequim; outra, mais afoita, essa colombina; a noite, transformava-se em Pierrô.
Chegou, inclusive a proteger uma manifestação do eu, criando a alfarataria das rachadinhas, metade Pierrô, metade Arlequim.
Adiando seu desejo, por vários anos, teve uma visão do futuro, sonho característicos das grandes síndromes. Resolveu candidatar-se a Presidente da Fazenda, sustentado pela proposta de destruir o Lobo Mau, um desviador dos lucros obtidos pelos mecanismos de produção.
Ele foi eleito pelas mãos da sorte, pois não apresentou propostas, não revelou as suas ideias sobre educação, saúde, violência, transporte, economia. Num discurso num sítio famoso, escorregou na escadaria do palanque, quebrando duas costelas, o pulso, fratura craniana que abalou, fortemente o córtex. Os seus admiradores tiveram orgasmos quando, um jornalista atrevido ou encomendado, o fotografou num leito de hospital, entubado, com uma arma na mão.
Tomou posse. Prometeu acabar com os desvios praticados pelo Lobo Mau. Os seus discursos, todos incoerentes, dividiu todos os componentes dos poderes políticos da grande fazenda. À tarde, com uma cuia na mão, distribuiu ódio, ira, loucura, inconsequência, mal-estar, medo, desequilíbrio, competição, sangue.
No dia 13, dia meio cinza, fez um discurso marcante, um divisor de água em seu destino político. Suas palavras marcantes foram: “Estou cansado, esgotado, preciso de vocês”. Construí o mundo em seis dias, criei tudo o que está diante dos seus olhos. Por isso, tenho o direito de queimá-lo, desviar rios, não escrever planos de governo, não resolver os problemas da saúde, da economia, dos direitos de ir e vir.
De repente, de um pontinho da linha do horizonte, surgiu uma família de vírus capazes de causar várias doenças, inclusive matar. Esse vírus matou mais da metade da população da fazenda. Prático Messias, contrariando os cientistas, distribuiu milhões de litros de groselha com suco de laranja à população. Não salvou ninguém. A inflação montou um jóquei club dentro da fazenda, o emprego desapareceu, a fome retornou como no tempo da Idade Média, o medo e o desespero montaram abismos profundos entre o delírio e a realidade.
Ontem, a fazenda explodiu, a população sumiu, a terra matou-se dentro das queimadas, o silêncio enorme rolou pelos morros e montanhas. Não sobrou uma alma para contar a história; somente o Prático Messias sobreviveu.
Agora, sozinho, ele pensa dia e noite. O que será que ele pensa?
“Vou provocar um dilúvio. Escolherei uma célula humana para construir uma barca. A célula crescerá, tornará gente. Multiplicara-se. E eu, todo poderoso, recomeçarei da estaca zero, do meu jeito.”
Prof. Carlos Roberto Rodrigues