Artur da Costa e Silva nasceu em Taquari, Rio Grande do Sul. O pai era dono do armazém que abastecia a pequena cidade. Artur, menino brincou nas ruas, nos bosques, caçou passarinhos, duelou com as bolas queimadas, brigou com a molecada do bairro do alto, apanhou dos garotos do Tibiriçá. Estudou na escola da Dona Ana; o boletim mensal sofria de hemorragia vermelha abraçando os números acanhados.
Na juventude, momento sem muitas incertezas encaminharam-no para escola militar. Estudou o necessário, rascunhou fórmulas compreensíveis ao longo de tardias temporadas; leu muito pouco, escreveu sobre as linhas espalhadas pelos cadernos e longe dos olhos. Leu alguns textos literários; a poesia, coisa curiosa, significava-lhe muito, pois representava palavras que dançavam longe de qualquer entendimento.
Um dia, mesmo inesperadamente, levando-se em conta a lógica da vida, conseguiu sair da Academia Militar. A partir de sua saída do local onde se fabricam os militares, nunca mais leu nada, nem a capa amarela ou azul, de livros expostos nas vitrines das livrarias. Graciliano Ramos passou a três quilómetros de sua distância. Érico Veríssimo, gaúcho como ele, nunca morou em sua mala de viagem ou permanência; Jorge Amado causava-lhe um certo arrepio, o oficial do exército não gostava de acarajé, Clarisse Lispector mexia com mundos altamente psicológicos, coisa semelhante a bruxaria. Da mesma maneira que nada leu, não fez cursos de aperfeiçoamento, cursos de especialização ou estudos sérios sobre a arte de cavar trincheira sem uso de artefatos de perfuração do solo.
O que sabemos, mesmo com ausência de documentação, é que fora escolhido e nomeado Ministro da Guerra de Castelo Branco. Esse cargo se a história estiver correta fora criado no ano de 1815; uma tentativa de fortalecer as forças armadas brasileiras em relação a Portugal. Nesse tempo o Brasil ainda era colônia da terrinha, propriedade da monarquia da terrinha, e financiador dos gastos exagerados dos portugueses. Costa e Silva, em seu governo maquiou o Ministério, transformando-o em “Ministério do Exército”, porém, não fez nenhuma mudança estrutural de relevo.
Voltando ao assunto, com muita calma e clarividência, na função de Ministro da Guerra, Costa e Silva resolveu perseguir Juscelino Kubistchek e outros políticos de destaque, antes da chamada revolução de março.
Os homens perseguidos viveram um bom pedaço de suas vidas sendo observados dia e noite. Mesmo estando numa praia, sentados numa gostosa cadeira de descanso, lendo um bom livro ou observando a beleza do mar e os voos das gaivotas, uma luneta, de longe, os observava atentamente.
Castelo Branco resolveu, por decisão própria desistir desse mundo; os militares reunidos no silêncio espontâneo do poder, depois de horas e horas de análises profundas, escolheram o General Costa e Silva para substituir o primeiro presidente militar; observando a hierarquia estabelecida pela matemática, perceberam que Costa e Silva, seria o segundo presidente militar.
O novo presidente tinha e sempre teve um aspecto rústico, o rosto meio flácido era real e permanente, o narigão sempre sugerindo inchaço, contrastava com o bigodinho curtíssimo, ralo, quase apagado. O uso de óculos escuro nos minutos estabelecidos pelos dias e pelas noites dilatava a imagem.
A sua esposa, Dona Yolanda, mulher linda, adorava realizar desfiles de moda no Palácio do Governo. É impressionante o manejo dos fatos históricos, mas num desses desfiles, um jovem cearense conquistou a passarela e o público, demonstrando sua elegância, beleza, altivez, no corredor da moda, esse jovem chamava-se Fernando Collor de Melo.
Em noites mais enluaradas, noites sem compromisso cultural, político, ou de economia de Estado, Dona Yolanda promovia rodadas e pôquer inesquecíveis nos anais da vida presidencial brasileira. A primeira dama do país, claro que não há singularidades especiais no fato, protegia rapazes inteligentes e promissores.
Um rapaz chamado Paulo Maluf aproximou-se de Dona Yolanda, expondo-lhe seus sonhos, seus desejos, sua vocação em bem servir ao Brasil. Deu-lhe presentes interessantes e belíssimos; pagou varias contas de jogo do presidente, recebendo em troca, a presidência da Caixa Econômica Federal. Houve festas, cantatas, comemorações. No aniversário da primeira dama, ocasião especial, Paulo Maluf a presenteou com um colar de diamantes, originário das noites misteriosas do oriente.
Pela sua bondade, gestos de cavalheiro e admirador, Maluf recebeu, em contrapartida, a prefeitura de São Paulo.
No governo de Costa e Silva, pela estampa que alavancava as ações do poder e das atitudes políticas, a juventude estudantil saiu pelas ruas do país, gritando e lutando pela liberdade de vida, vontades, conquistas, realização de sonhos. Os militares responderam com mais repressão, as manifestações foram proibidas, a violência espancou corpos em todas as esquinas. O policiamento militar, em marcha sem ritmo definido, invadiu universidades, cassou manifestantes nas salas de aulas e bibliotecas. Os estudantes, em resposta, partiram para a luta armada; os operários movimentaram greves nos espaços possíveis.
Numa noite sem rosto detalhado, os militares produziram a página mais triste da história constrangedora do país, o Ato Institucional 5, uma carta branca permitindo a perseguição de todos os opositores do regime, fechamento do Congresso, fechamento das Assembleias Legislativas.
O Brasil, de repente tornou-se uma terra dominada pela escuridão; os números de todas as casas foram retirados e substituídos pela desilusão e a morte passou a ser um fato corriqueiro.
No entanto, a causa do AI-5 está no discurso pronunciado pelo Deputado Marcio Moreira, em Seção Parlamentar de setembro de 1968. Num trecho do seu discurso o deputado diz: “o exército transformou-se num valhacouto de torturadores”. Embora tenham levado um bom tempo para entender a mensagem, pois valhacouto pode significar abrigo, refúgio, reduto, esconderijo, ninho; os militares exigiram que o parlamento abrisse um processo contra o Deputado. O parlamento não concordou com a exigência do pedido dos militares; não abriram processo contra o Deputado, que usou o direito de expressar as suas ideias.
A resposta do Governo,
De Costa E Silva,
Foi a criação do AI-5.
Prof. Carlos Roberto Rodrigues