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sábado 16 novembro 2024
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Leitura de Taubaté – Majestade

São nove horas da manhã. Estou diante de 13 navios lindos, fortes, semi-construídos e seguramente financiados por comerciantes judeus. Ao meu comendo, Deus dê-me sabedoria para a função, tenho 1500 marinheiros; a maioria conhece o mar, os astros, os ventos, o movimento das ondas, como ninguém. Neste aspecto estou bem servido.
Fazem parte da minha tripulação, alguns intérpretes acostumados a ouvir, tentar entender, decifrar a linguagem de nativos, povos selvagens que, sempre acontece, possamos encontrar pelo caminho, são os expulsos da Torre de Babel. A linguagem, meu Senhor, é o mecanismo mais complexo deixado aos homens, por vontade direta de Deus, criador de todas as coisas. Levo alguns depredados, homens que praticavam crimes considerados bárbaros. São silenciosos, caminham em grego, sonham os mesmos sonhos, imaginam os acontecimentos identificados com a mesma raiz, ou origem.

Ao meu dispor, embora não tenha solicitado, conto com um grupo de navegadores italianos, todos capitães, apresentando um passado conflitante com as forças marinhas daquele país, confrontos gerados pela indisciplina, neurose, psicopatia ou falta de vivência com os padrões normais estabelecidos pela vida. Um deles, no entanto, me preocupa muito, pois com toa a certeza trata-se de um homem atormentado, segundo Dr. Vasconcelos, um dos estudiosos da alma humana.

Esse navegador de origem italiana, chamado Messias, deve ter tido sérios problemas na infância, na adolescência, no desenvolvimento sexual e, com certeza bamboleou diante das mulheres que passaram pela sua vida.

Majestade, hoje atravessamos uma maresia descontrolada ao longo das Canárias. A frota dispersou-se por alguns instantes, mas Deus a uniu novamente. O capitão Messias teve um surto, berrava no convés, espumava e berrava que era macho, atleta, militar, desafiou os deuses, chamando-os de frouxos, de gays, e outras barbaridades; mas os deuses se divertiram, nunca tinham visto um ser humano tão descontrolado, atormentado, aloprado, aluado.

Tivemos alguns problemas ao atravessarmos as águas do Cabo Verde. Os meus técnicos consultaram os mapas, verificaram as rotas, confrontaram os traçados, porém, os planos de navegação estavam corretos e exatos.

O capitão Messias teve outro surto, tentou provocar um clima de instabilidade e fofoca na caravela, mas foi contido a tempo. Majestade, no dia 22 de abril avistamos terra. Havia árvores, praias, belezas indescritíveis e gente de pele bronzeada.

Dois dias depois da visão, ancoramos com muito cuidado e atenção. Observamos os detalhes próximos e distantes, entramos em contato com o povo. O capitão Messias tentou seduzir uma índia, mas por pouco, pouquíssimo mesmo, quase foi transado por um grupo de auxiliares do pagé, chefiado por um guerreiro chamado Mourão.

No dia 1º de maio tomamos posse da nova terra e, só o fizemos, porque o território era realmente novo, desconhecido. À primeira vista, tinha muita semelhança com o paraíso plantado por Deus. Caminhamos muitas léguas a beira mar. Frei Henrique de Coimbra, um franciscano, celebrou uma missa, ao entardecer. Fizemos uma cruz de uma madeira estranha, mas ficou bonita. O cacique informou nos que havia alguns índios doentes; fomos vê-los; o doutor Jorge não reconheceu a pestilência. O capitão Messias disse tratar-se de uma “gripezinha”, coisa de mulher. Ele achou umas folhas verdes chamadas cloroquina; fez chá e bandagens. Os ´[índios da fila da direita tomaram chá de cloroquina; os que foram para a fila da esquerda, tomaram água suja de um barril, água baiana, nome dado por ele, por inspiração de um Deus branquelo, chamado Edon Macedo, dono de lima taverna universalizante, cavada nas montanhas.

Os índios mortos foram enterrados numa vala comum, a vala dos maricanos, nomenclatura do dicionário do capitão Messias. Ontem visitamos a mata de pau-brasil, não há como medir a dimensão, pega de uma ponta a outra do horizonte. O capitão Messias queria abrir uma zona de prostituição, baseada em sua teoria: “Venham. Roubem pau brasil, façam sexo com as mulheres bronzeadas, paguem pelo método das rachadinhas, isto é, recebam uma parte do pagamento de volta”.

Majestade, hoje o sol nasceu como nunca nascera antes. Colocamos o capitão Messias no pequeno barco, estamos enviando-o de volta, ele enlouqueceu: “ Fala diante horas sobre o índio Dória, o cacique Lula, o chefe Moro, cloroquina, CPI, Lira, tem medo de ser transformado em jacaré, quer comprar um fuzil, mas não quer pescar lambari, fala de várias mulheres, de filhos machos e de uma brochada que resultou no nascimento de uma menina”.

Fora desses fatos desagradáveis continuamos nossa jornada até as Índias, onde chegaremos daqui a 30 dias.

Prof. Carlos Roberto Rodrigues