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sexta-feira 22 novembro 2024
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Leitura de Taubaté – Lobato: Cartas de amor

Em 1906, o escritor Monteiro Lobato, recém formado no curso de Direito, andava meio desolado pelas ruas de Taubaté, em sua bicicleta de origem européia. Em outros momentos do seu dia, auxiliava o avô, Visconde de Tremembé, na administração dos seus negócios. À noite, estrelada ou não, correspondia com a juventude paulista, colegas de boemia, amigos da faculdade do Largo de São Francisco, das noitadas dos teatros, dos famosos cafés musicados, dos delírios literários, das mulheres e dos amores apressados.
A cidade, por outro lado, convivia com a agitação causada pela realização do Convênio de Taubaté, uma tentativa de elaboração de um texto que contornasse a crise gerada pela super produção de café. As nossas ruas conviveram por uns dias, com as presenças dos presidentes de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.
Na Praça Dom Epaminondas, os adoradores do carnaval comentavam sobre os escândalos causados pela atriz Maria Lino ao lançar o maxixe “vem cá mulata”. Essa música foi o grande sucesso do carnaval de 1906. O maxixe teve sua origem no batuque, dança afro-brasileira cruzada com o tango, e, por isso, censurada pelos puritanos daquele tempo.
Nesse ano de 1906, numa tarde de quarta-feira, chegou a Taubaté a jovem Maria Pureza Natividade, para passar uma temporada na casa do avô, o velho professor Dr. Quirino que, inclusive, fora professor de Monteiro Lobato.
Maria Pureza era loira, clara, linda de chamar a atenção, o desejo, o interesse. Os rapazes de Taubaté, estudantes, funcionários públicos, alguns advogados, disputaram o direito de lhe fazer a corte, como diziam naquela época. O jovem Aurélio Barroso empenhou-se, durante uma semana, para prender tocar uma valsa no piano, atravessou noites e madrugadas, martelando o teclado do piano do professor Valdomiro Mendonça.
A fraude fora descoberta e Aurélio, após enfrentar as brincadeiras da rapaziada, mudou-se para Jacareí.
Monteiro Lobato aprendeu, com o Visconde, seu avô, um jogo nascido na Índia, em Chaturanga e, de lá, divulgado para o mundo, chamado xadrez, uma espécie de esporte, de ciência e variações de pura arte. Utilizando-se desse conhecimento e técnica, Lobato apresentou-se à casa do velho mestre, Dr. Quirino, bom jogador de xadrez e um homem apaixonado pelo esporte. O jovem, neto do Visconde, conversou com o avô de Purezinha durante horas, falaram sobre a história de Taubaté e intercalando o assunto comentaram a ciência que envolvia o jogo xadrez. A noitada terminou em frente ao tabuleiro freqüentado por peões, torres, cavalos, bispos, rei e rainha.
Todas as noites o jovem Lobato dirigia-se a casa do velho Quirino, para uma partida de xadrez. Durante o jogo, no momento que o brilho da lua atravessava a vidraça da sala, a porta da cozinha abria-se lentamente e a jovem Tereza, com uma bandeja nas mãos, oferecia aos afoitos jogadores, uma xícara de café com bolinho de farinha de milho.
Após muitas noites marcadas pelo tabuleiro de xadrez, dezenas e dezenas de xícaras de café, muitos poemas, péssimos poemas, escritos por Lobato num jornal de Taubaté, Tereza e o Dr. Quirino aceitaram o pedido de “fazer-lhe a corte”, solicitado e implorado por Lobato.
Esse namoro, em princípio, rejeitado pelo Visconde de Tremembé rendeu centenas de cartas apaixonadas, cartas de amor que, a partir da próxima semana estaremos comentando nas páginas do jornal Diário de Taubaté.

Prof. Carlos Roberto Rodrigues