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terça-feira 26 novembro 2024
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Fé e Razão – Valorizar os fracassos

Vivemos numa sociedade em que existe o temor do fracasso. O objetivo que é proposto, e que ressoa como resultado determinante da felicidade e do êxito de uma vida, é o sucesso. E não só o sucesso é perseguido, como é considerado aquilo que salva uma existência.

De outra maneira, a pessoa sente-se uma fracassada, contada entre os descartados da sociedade.

Esta parece ser uma doença espiritual do nosso tempo, e muitos estão convictos de que o sucesso deve ser procurado como o desejo por excelência a inocular nas novas gerações. Não foi por acaso que o cineasta e escritor italiano Pier Paolo Pasolini (1922-1975) escreveu: “Penso que é necessário educar as novas gerações para o valor da derrota.Para a sua gestão.Para a humanidade que dela brota. Para construir uma identidade capaz de perceber uma comunhão e destino, onde se pode falhar e recomeçar sem que o valor e a dignidade sejam atacados. Para que não se tornem conquistadores sociais, para que não passem sobre o corpo dos outros para chegar primeiro”.

Muitos perseguem o êxito a qualquer custo, de sucesso no mundo, e portanto tornaram-se incapazes de entrever a possibilidade da fraqueza e do consequente fracasso. Muitos sacrificam a vida autêntica na busca do sucesso abrindo mão de valores essenciais para existência humana.

O drama que vivem nesta reviravolta epocal nas sociedades ocidentais é precisamente determinado por uma falha.
Por isso o fracasso deve ser inscrito no itinerário da existência humana. A queda e o fracasso não podem ser removidos porque estão inscritos na “infermitas” (enfermidades) das vidas humanas, na fragilidade que nos conduz a falhar.

Pode chegar a hora da queda e, como dizia uma padre do deserto: “no fracasso vai-se ao fundo, toca-se o fundo, mas no fundo descobre-se o fundamental”.

A queda e o fracasso que nos esmagam por vezes são legíveis e motiváveis, outras vezes permanecem na obscuridade e são enigmáticos, sobretudo as crises interiores, existenciais, quando caímos no nada e deixamos de ser capazes de reencontrar o sentido das coisas e da vida.

Então reina a noite, a treva, e também Deus é percebido nesse momento de crise como mudo. São Bernardo de Claraval (1090-1153), após uma vida repleta de sucessos, considerado o homem do século XII, ao ponto de ter sido decisivo inspirador do papa, viveu uma crise terrível: deixou o mosteiro, retirou-se em solidão num bosque, e chegou a reconhecer “ter passado rente ao inferno, caindo e caindo”. Mas depois daquela crise escreverá: “ Ó desejável fraqueza!”.

Não quero concluir estes pensamentos com a cereja da esperança, mas simplesmente despertar a consciência de que também o fracasso faz parte da vida e não deve ser afastado; seja então proclamado: “Feliz fraqueza!”.

Prof. José Pereira da Silva