Que podemos compreender de nós e do mundo se, em vez de evitarmos o silêncio para nos fazermos saturar do fazer cotidiano, olharmos a vida do próprio silêncio?
Quais são os desejos verdadeiramente essenciais? O que quer dizer pensar? O que quer dizer fazer uma escolha? Qual é o sentido da existência e o que tema ver com aquilo a que chamamos o bem? O encontro com o silêncio é o umbral de acesso a uma reinterpretação da nossa identidade, da liberdade, do encontro com os outros, do caminho coma consciência.
Mas todo aquele que tenha realmente encontrado o silêncio pôde aprender que ele nunca é somente um umbral, um espaço ou uma dimensão particular da existência humana, mas é acontecimento, revelação, invisível proximidade de um Outro. Por isso, aquilo que verdadeiramente conta é reconhecer.
A ideia é a de que para compreender o silêncio, a sua proximidade cotidiana, é necessária uma distância, a distância ao modo corrente de pensar.
Mas uma vez alcançado este distanciamento, damo-nos conta de que não se trata tanto e apenas de mudar a maneira de pensar o silêncio, mas o fato de o silêncio nos impelir a mudar a maneira de pensar.
O silêncio, no seu valor revelador, é a porta pela qual se pode aceder a um outro código de interpretação da realidade.
A presença discreta do silêncio é central quer para a existência de cada um, quer para as formas mais elaboradas de experiência do sentido: a fé, a arte, a filosofia, a investigação científica quando é vivida como escuta e participação na vida do universo.
Pra o ser humano que vise atingir os seus propósitos, o silêncio é uma zona obscura, um vazio angustiante a rejeitar, preenchendo de sons e ruídos a mente e de atividade e compromissos o dia.
A confirmação de como se generalizou esta tendência a considerar o silêncio um estranho indesejado está na raridade em encontrar pessoas que tenham tempo, disposição e a abertura necessárias a escutar, dado que a escuta vive precisamente do silêncio.
A dor oferece a possibilidade de permanecer no silêncio para depois começar a vivê-lo como busca. Porque, mais que o maravilhamento, mais que a alegria, talvez ainda mais que um desejo espontâneo da alma, é a dor que nos impõe buscar um sentido para a existência.
Nunca vemos o silêncio no rosto. Devemos, antes reconhecê-lo na sua habitação na arte, na experiência da liberdade, na busca de sentido, na relação com Deus e com os outros.
O silêncio não é mera ausência de palavras, sons ou ruídos, não é um espaço indefinido de não sentido, nem a pausa entre uma palavra e a outra. Ao contrário, o silêncio possui uma força comunicativa misteriosa e radical.
Muitas vezes, para as coisas melhores da vida faltam-nos as palavras, e as poucas que temos surgem desde logo como retóricas e gastas, se não ilusórias.
O tempo é nos dado simplesmente para ser, para nos reencontrarmos. O silêncio começa então a falar a sua língua, traduzindo-se antes de tudo como uma nova experiência do tempo: o encontro com o tempo como duração plena de possibilidades inéditas, espaço inesperado para mudar, reconhecer, aprender.
Prof. José Pereira da Silva