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domingo 5 janeiro 2025
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Fé e Razão – Morte não é aniquilação, mas transformação

No poema “Morte e Vida Severina”, de João Cabral de Melo Neto, se diz: “ E se somos Severinos iguais em tudo na vida, morremos de morte igual, mesma morte Severina: que é a morte que se morre de velhice antes dos 30, de emboscada antes dos 20, de fome um pouco por dia”. A morte acontece sempre em todas as regiões da terra. A morte não é destruição, mas transformação. Tomemos uma semente de milho como exemplo. Dentro dela está todo o projeto embrionário de uma planta. Quando a colocamos na terra, ela aparentemente morre, mas daí, a partir dela, surge uma planta, que já não tem a mesma aparência da semente. Aquela planta traz em si todas as características que a semente possuía, mas não é mais a semente, houve uma transformação.

Na morte há um corpo que é sepultado ou cremado. Contudo, a fé na ressurreição nos diz que a vida não foi destruída, mas transformada. A pessoa falecida vive junto de Deus, mas em novo estado existencial.

No passado se falava muito em vida após a morte, hoje a preferência é dizer Vida após a vida, pois a morte torna-se passagem para a vida eterna. Muita gente costuma dizer que para todo problema há umas solução e que somente diante da morte não se pode fazer nada. Na verdade podemos dizer que na morte cessam as capacidades humanas e entram as forças divinas. Então, para morte existe solução, sendo que a ressurreição é o presente de Deus a quem ele chama para vida eterna.

O dia da morte é o verdadeiro natal da pessoa. É o dia do encontro com Deus no céu. Com a morte, o nosso eu não é destruído. Deus não cria para destruir. Na eternidade encontraremos as pessoas com seu ser definido.Deus lhe oferece a plenitude da vida. Vive-se inserido no mistério de Deus.

A ciência tem uma explicação para a vida desde a sua concepção até a sua morte. Já a fé vai além da morte. A nossa fé nos diz que Deus não cria para destruir.

Assim visto, a morte não é uma aniquilação que reduz o será nada. Após a morte é, portanto, natural que cada ser humano conserve a sua identidade. Pela identidade conhecemos a pessoa. A identidade é o que a pessoa é em si.

Na morte nos apresentamos diante de Deus como realmente somos, e não como pretendemos ou gostaríamos de ser. Deus , que é Amor, nos envolve e nos põe definitivamente dentro de sua vida, e de nossa aparência fica só a essência do ser que nasceu de Deus. Quanta liberdade e alegria, quando cessarem as aparências, as imagens criadas por nós e pelos outros, as projeções mentais, para ficar somente o mistério de uma vida criada e vivida diante do mistério do Criador que eternamente vive.

Na morte deixamos o que apresentamos ser para nos revelarmos como realmente somos, porque nossas apresentações são ainda muito limitadas pelo tempo, espaço e condicionamentos humanos e históricos. Há em nós um pouco do que seremos, mas está encoberto, e somente o fim de nossa peregrinação terrena nos possibilitará ser plenamente o que somos.

A morte sempre traz um vazio, uma dor, mas este vazio vai sendo preenchido pela fé. Nascemos de Deus e para ele retornamos. Chegamos à eternidade não vazios, mas com as marcas da história que participamos. Cristo, abrindo-nos as portas da eternidade, preencheu com a esperança da ressurreição todo o vazio deixado pela morte. Encontra a vida eterna quem foi semeado em Deus, nele germinou, cresceu e produziu frutos. Jesus prometeu vire fazer morada na vida humana: “Se alguém me ama, guardará minha palavra; meu Pai o amará, e nós viremos e faremos nele nossa morada” (Jo 14,23).

A memória do passado, dos antes queridos que já se foram; e a memória do porvir, do caminho que nós havemos de percorrer. Que ninguém tenha medo de se encontrar depois da peregrinação terrena, na esperança de ser recebido nos braços da misericórdia infinita de Deus. Que a morte corporal nos encontre vigilantes na oração e repletos de todo o bem praticado ao longo da nossa existência, breve ou longa que tenha sido. Devemos pedir a Deus que nada nos afaste de Dele nesta Terra, mas tudo e todos nos sustentem no desejo abrasador de descansar tranqüilo e eternamente em Deus.

A celebração do Dia de Finados e nossas orações pelos falecidos tem o propósito de nos fazer pensar em algumas perguntas fundamentais: Quem somos , como estamos e para onde vamos? Somos filhos de Deus em processo de amadurecimento. Estamos na vida e nossa missão aqui é viver parar ressuscitar. Como a vida é uma grande viagem de volta para casa, estamos nos dirigindo para a morada eterna, onde esperamos entrar definitivamente no convívio com Deus. A fé nos conforta. Rezar faz bem. Colocar a pessoa junto de Deus é muito bom e dá paz. A bênção de Deus venha com a confiança de que o que restará é somente vida, e vida em plenitude.

Prof. José Pereira da Silva