Vivemos imersos em mensagens, mas doentes de uma afasia (incapacidade de compreender, falar, achar palavras certas),de uma incapacidade de interpretar a vida em profundidade e de estabelecer, de maneira explícita, os novos nexos. É como se cada geração proviesse do nada.
Não raro, as novas gerações olham para trás e não vislumbram testemunhas, transmissores, mediadores para a passagem que devem realizar de uma margem para a outra. Acreditar no valor da experiência , no fazer e refazer da experiência em todas as estações, no grande passo de civilização que representa, por exemplo, o reconhecimento da vulnerabilidade que nos fere e da necessidade de perdoar e de ser perdoados, reconhecendo a ambigüidade que está em nós. É uma sociedade que não quer escutar a voz doa anciãos, sociedade devorada pela amnésia.
Fenômeno agravado pelo impulso tecnológico que caracteriza o nosso tempo, e faz com que sejamos todos um pouco como árvores sem raízes.
Essa crise de memória e de transmissão vive-se a todos os níveis: na família,nas instituições, na sociedade no seu conjunto.
Semear uma visão honesta daquilo que em nós resta por fazer, para clarificar e para decidir até o fim. Mostrando como somos atravessados por tempos tão diferentes, que é preciso acolher com esperança, numa interminável aprendizagem.
O tempo não é só uma clepsidra (usado para medir o tempo na antiguidade) que se esvazia, não é só o Kronos que nos devora. O tempo é o nosso momento, a nossa oportunidade para crescer, amadurecer, para aprender a viver com sabedoria. Existe um tempo para tudo.
Muitas vezes, é a vulnerabilidade o nosso mestre inesperado, pois revela-nos a nossa condição, aquilo que preferíamos não ver.
O momento presente não é apenas uma passagem horizontal, quantitativa, na perspectiva de uma realização entre este instante e aquele que o segue. Mas o presente tem também um sentido vertical que requalifica o tempo.
Não estamos na origem de nós mesmos, mas que somos aquilo que recebemos dos outros, somos expressão do dom, uma preciosa herança que nos transcende.
É insensato fundar a busca de realização sobre uma visão materialista, utilitarista e hedonista da vida. Quando se reduz a existência à sua estreita materialidade chega o momento em que se compreende que tudo era ilusão e correr atrás do vento e que nada havia de proveitoso debaixo do sol.
A crise dos modelos de felicidade assentes no bem-estar material. Falta uma visão integral da vida, que é necessariamente uma visão sapiencial que abraça a existência humana na sua inteireza.
A nossa sociedade declarou tabu a doença, o sofrimento, o envelhecimento e a morte. Nas sociedades consumistas como as nossas as pessoas se tornam analfabetas da vida e das suas expressões fundamentais. Numa sociedade vista como um mercado, esquecemos facilmente aquilo que não se compra nem se vende. A felicidade, de fato, não é um automatismo, mas uma construção sapiencial.
A sabedoria não significa um conceito, mas uma experiência integral da própria vida; um olhar de conjunto que abrace não só a parte, mas o todo. Há um tempo para tudo, e a vida pede-nos uma visão poliédrica e inclusiva, capaz de respeitar a totalidade. Não é guiada por um determinismo que a torna indiferente às circunstâncias. É uma ilusão pensar que temos tudo sob controle.
O tempo de Deus vai além e muitas vezes revoluciona a previsibilidade do tempo humano. Muitas vezes o ser humano não consegue perceber plenamente o sentido e os nexos de tudo aquilo que acontece.
O sentido do tempo na sua duração total transcende o nosso olhar, pertence ao plano do mistério. E não podemos perder o sentido do mistério. A vida é maior do que a expressão da existência individual ou da de uma época.
Prof. José Pereira da Silva