Mossoró dos Campos era a típica cidadezinha do interior de um estado qualquer no Brasil.
Ar puro, árvores, morros, natureza bela, rio de águas claras onde carpas e pacús nadavam tranquilamente e dourados pulavam pra fora das águas, tranquilidade, paz e sossego.
Porém, o tempo parecia ter parado. Progresso? Os moradores nem sabiam o que era isso. Não havia indústrias, grandes comércios, colégios, faculdades, lazer e nada acontecia.
Para boa parte dos Mossoerenses, o dia começava às quatro da manhã. O despertador tocava e lá iam os pequenos fazendeiros, ou sitiantes, esposas e filhos ordenhar as vacas, dar feno pro gado, recolher os ovos, milho para as galinhas, frutas, verduras e gramas para os porcos.
Depois, o lauto café da manhã com coisas da roça, queijo branco, manteiga, ovos cozidos, bolo de fubá, leite fresquinho, geleia de amora e, é claro, o delicioso café.
E depois? Hummm…criançada na escola, só até o fundamental II, é claro.
Almoço saudável, depois nadar ou pescar no rio, cada dourado gigante se pescava ali, mas o sol, quase sempre escaldante, fazia boa parte dos Mossoerenses tirarem uma pequena sesta de duas a três horas e a cidade, quase fantasma, se tornava realmente fantasma.
Nesse momento, o tempo parecia literalmente parar em Mossoró dos Campos. Gente andando? Não. Carroça nas ruas de terra? Nem pensar. Nada se movimentava ali, nem os vira latas ousavam sair no sol forte, pássaros se aquietavam e até às moscas davam sossego.
E, como diziam alguns, em Mossoró dos Campos, até a chuva tinha preguiça de cair.
Fim de tarde, talvez, andar lentamente pela praça pro tempo passar. Aliás, a praça era o centro “nervoso” da cidade.
Em volta dela ficava a Prefeitura, cujo prefeito raramente aparecia, afinal, no Brasil inteiro político tem a fama que não é de trabalhar (outras “cositas” sim), porque em Mossoró seria diferente?
Ao lado, ficava a delegacia, com uma única cela que nos últimos vinte anos teve apenas três inquilinos (e, claro, não eram políticos). Tinha o armazém do seu “Zé”, que abria quando ele não estava com preguiça e era o único lugar onde se encontrava cachaça da boa. Ao lado a sorveteria, carrinho de lanche, pipoqueiro, doceria, um açougue quase falido, uma pensão com três quartos que, em cinquenta anos tivera lotação completa cinco vezes. E, na praça, muitos bancos para curtir a preguiça, ah, e também o tradicional coreto. E, bem longe da praça, no final da rua, estava a casa das primas com três senhoras que estavam ali há, mais ou menos cinquenta anos. Precisavam renovar o pessoal, mas estava difícil.
E assim a vida seguia em Mossoró dos Campos, lentamente, preguiçosamente.
O tempo parado, os jovens se quisessem fazer colégio (nunca queriam) teriam que viajar sessenta quilômetros até a cidade mais próxima, haja preguiça, ninguém ia.
Mas, em um belo dia, uma grande notícia! Uma multinacional, milagrosamente, se instalaria em Mossoró. Comentários, frisson, só se falava na grande novidade. Vai ter empregos, vem gente de fora, a cidade vai crescer, o progresso finalmente chegaria. Surgiriam outras empresas para fornecer materiais para aquela, surgiriam cursos profissionalizantes, colégios e faculdades, a vida realmente começaria em Mossoró. Uma luz no fim do túnel.
E a multinacional se instalou, muita gente veio pra cidade, dona Eva quadruplicou o número de quartos na pensão. Dois colégios já se instalavam e alguns diziam que até uma faculdade estava para vir. Outras fábricas, mais gente, outra pensão e o progresso chegou a Mossoró, porém, os peixes sumiram por causa do rio poluído, as empresas desmataram e o ar deixou de ser puro. O asfalto novo provocava enchentes, antes desconhecidas, havia muitos bares e brigas e a delegacia aumentou. A violência fazia parte do pacote e viera junto com o progresso.
Pessoas e vira latas não cruzavam mais as ruas, não por preguiça e sim para não serem atropelados por motoristas bêbados e irresponsáveis.
O progresso, finalmente, chegara a Mossoró dos Campos.