Quem nunca, né? Qual escritor que nunca se viu diante da tela branca do computador, olhando, olhando, sem saber o que escrever.
Então, estou assim, nessa noite de terça-feira, com esse gostoso e frio ventinho. Adoro o friozinho, olho para fora, vejo a garagem da minha casa e um pedaço de rua, silenciosa, vazia, deserta, com pessoas “guardadas” em suas casas fechadas.
Tudo o que um escritor precisa, silêncio e solidão, mas nada inspira, nem a garagem, nem a rua deserta, nem o silêncio e nem o frio. Tá difícil.
Para tentar buscar inspiração coloco a música “I still haven`t found what I`m looking for” da maravilhosa, espetacular, banda U2. O nome da música até parece sugestivo, né? Até parece de propósito, mas não foi não, só coincidência, pelo menos, eu acho. A não ser que, mais uma vez, o universo com seus mistérios insondáveis tenha resolvido pregar uma peça. Bom, sei lá.
De qualquer maneira, com ou sem a música, sigo sem inspiração. Olho para fora com olhar perdido e fico alguns minutos olhando a noite e a música acabou. No automático do aplicativo de músicas vem a inebriante canção “With or without you” do mesmo U2. Outra música que nos envolve, nos anestesia e nos leva para uma viagem até dimensões distantes.
Música simplesmente maravilhosa, verdadeira obra de arte, mas continuo sem inspiração…
Me levanto e vou até a cozinha procurar algo para comer, afinal, não há nada melhor para deixar um gordinho feliz. Agora a inspiração vem. Pego o pote de paçoca, uma colher para retirar a danada, um bonito pote de sobremesa, uma colher daquelas pequenininhas que as pessoas chiques dizem ser de chá (uau, que bonito) para comer a paçoca. Tô muito chique. Levo tudo para a mesa onde está o notebook e ao abrir o pote me vem o cheiro da minha infância, como sempre. Sim, paçoca me lembra os bons tempos em que comia a paçoca feita no moedor de carne ha ha ha ha ha, pela minha querida e saudosa mamãe. E quantas vezes moi o amendoim lá…, oh delícia de tempo, oh, saudades.
E me pergunto porque o tempo tem que passar, né?
Paçoca, talvez seja a sobremesa que mais gosto, a torta de limão e o Romeu e Julieta que me perdoem, mas paçoca é demais. E gosto de qualquer jeito, moída, feita em casa ou comprada no supermercado ou, ainda, aquelas industrializadas no formato rolha, oh, meu Deus. Bom demais.
Coloco duas colheradinhas, afinal a colher é pequenininha, na boca e fecho os olhos por alguns segundos, saboreando aquela coisa maravilhosa. Abro os olhos e a tela do notebook continua me olhando e rindo. Minha mente maldosa me faz pensar que há uma frase com letras garrafais me dizendo que a inspiração ainda não deu as caras. Tudo bem, daqui a pouco ela vem.
Olho para fora mais uma vez, o friozinho continua, o silêncio continua, as pessoas continuam em suas casas e a dona inspiração continua sem dar a cara por aqui. Oh, meu Deus!
Penso em meus escritores favoritos e me pergunto o que fazem nessa hora.
E, lembro o que disse o espetacular escritor Franz Kafka:
“Escrever significa abrir-se em demasia. Por isso, não há nunca suficiente solidão ao redor de quem escreve; jamais o silêncio em torno de quem escreve será excessivo e a própria noite não tem bastante duração.”
Droga, estou sozinho em casa, à noite, e o silêncio só é quebrado pela música do U2. Estou saboreando uma maravilhosa paçoca e a tela em branco insiste em olhar para mim, insiste em gritar para mim. Ah, tela em branco…, sacanagem, para de me olhar assim.
Insisto, persisto. Esvazio os pensamentos, sorrio, engulo mais um pouco de paçoca e nada.
Ah, quer saber? Hoje não é dia de escrever, talvez esteja cansado, com sono, talvez preocupado, talvez pensando nos diversos livros que estou escrevendo ou em algum em especial, sei lá.
Olho para fora, sorrio, admiro o silêncio e a noite, percebo essas duas maravilhas e agradeço a Deus por poder contempla-las. Com prazer coloco mais uma colheradinha de paçoca na boca e saboreio. O sabor, o cheiro, como sempre, me lembram a infância e antes que lágrimas resolvam deslizar por minha face, abro os olhos para observar a tela cheia do computador.
Estou feliz, comi paçoca, admirei a noite, curti o silêncio, escrevi minha coluna e agradeci a Deus por tudo. Agora é hora de dormir, amanhã começa tudo de novo, Graças a Deus!