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segunda-feira 23 dezembro 2024
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Comilanças Históricas e Atuais – A fuga do delírio de um rei

I – Como nascem os contos de fadas:
Charles Perraut viveu no século XVII. Era um escritor, poeta e, para sobreviver, praticava advocacia. No final da vida, observando os seus filhos e os filhos de uma sociedade sofisticada que definia as crianças como adultos pequenos, não importando-se com seus sonhos, com o desenvolvimento da imaginação infantil descobriu uma forma de colocar dentro das crianças a emoção, as lágrimas, a poesia, e o direito de voar para os castelos onde moravam o sonho e a recriação da natureza plena da vida. Ele aproveitou uma noite bem fria; acendeu a lareira, despertando a dança das chamas; apanhou a pena, a tinta, centenas de folhas de papel e, como um maestro, escreveu as histórias infantis, que a sua mãe lhe contava nas noites geladas e descoladas do tempo. Para isso, deu uma roupagem literária às histórias milenares, criando um novo gênero de literatura, os contos de fadas.
A sala, segundo dizem, estava vazia, mas não demorou muito para a chegada de “Chapeuzinho Vermelho”; “A Bela Adormecida”; “O Gato de Botas”; “O Pequeno Polegar”; “Cinderela”; “Pele de Asno”; “A Gata Borralheira”. Depois da chegada desses personagens, nunca mais o mundo foi o mesmo; ele ficou colorido, tudo acontecia; o amor abraçou a justiça, a paz, os delírios possíveis. Assim, no dizer das fadas e das varinhas mágicas, o universo começou a brincar, rir, chorar, sem dor, medo, ou agonia.

II – O cinema encontrou a infância
Em 1970, o premiado diretor de cinema Jacques Demy adaptou o conto infantil “Pele de Asno” e o dirigiu, arrastando milhares de pessoas aos cinemas da França, da Europa e do restante do mundo, colocando a cultura dentro da cabeça de Charles Perrault.

III – O filme
Num reino distante, um rei amado pelo povo, respeitado pelos reinos vizinhos, vivia um tempo muito feliz ao lado de sua bela rainha e de sua filha única.
No filme, segundo uma linha psicanalítica em alto relevo, as câmeras mostram o rosto da rainha somente três vezes, procurando evitar a penetração em sua psiquê. Os seus cabelos castanhos; o seu movimento demonstra o charme da monarquia, ou seja, o “eu” não singularizado; os seus gestos colocam o seu interior ao alcance dos outros. As cenas são narradas por uma voz off, o que dá a história uma afeição de onisciência.

IV – O castelo
O castelo sobressai-se no conjunto que o rodeia; a sua sombra sob a claridade da lua atribui-lhe um atestado de nobreza, poder, tranquilidade. Há no castelo um espaço muito significativo, um estábulo. Nela há cavalos de todos os pontos do mundo, cavalos destinados a encantar os olhos, a paixão e a grandeza da vida. Nesse pedaço de chão encantado, encontra-se a verdadeira causa do arrebatamento do rei, isto é, um asno cinzento de orelhas e dentes enormes. Esse animal mantém o sistema econômico do castelo, pois ele defeca dinheiro, diamantes, rubis, esmeraldas e moedas do mundo todo.

Os criados do rei, durante o seu passeio ao estábulo, montam uma mesa enorme na parte gramada do palácio. Todos os criados têm o rosto azul, pois as suas peles, também, pertencem ao rei. O céu começa a se fechar, a beleza se encolhe, a tempestade se aproxima. A mesa é desfeita, o vento varre as pétalas das flores; no interior do palácio, cercado pelos grandes médicos, a rainha padece de uma doença grave e desconhecida.

V – A morte – A política – O tema do conto
O rei, chorando, está aos pés da rainha. Antes que a morte a leve, faz um pedido ao seu marido, a majestade daquelas terras: “Os ministros, os conselheiros exigirão que cases novamente, para gerar um filho homem, capaz de dar continuidade ao seu poderio. Quero que cases com uma mulher mais bonita do que eu”.

O caixão da rainha fica esculpido em forma de um círculo, todinho de vidro, a rainha parecia uma flor linda, dormindo um sono profundo.

A neve parecia fios de linha costurando a natureza, a dor, a solidão. A filha, princesa, aproxima-se do pai, usando a voz que formatava a sua alma, diz ao pai: “Venha meu pai”. O rei, sem mirá-la lhe disse: “Me deixe só minha filha. Nunca mais quero ver você”.

Os ministros, depois do enterro, trazem ao rei centenas de fotografias das princesas dos reinos próximos e distantes. Somente uma foto lhe agrada, só uma das princesas era mais bonita do que a falecida e, para espanto de todos, era a foto de sua própria filha. Nesse momento o tema do conto é revelado, ou seja, trata-se do incesto e do famoso Complexo de Édipo.

VI – Pedido de casamento
O rei manda um ministro chamar a princesa, sua filha. Olhando fixamente para a mulher que está em sua frente, lê para ela um poema de Apolinaire, um poeta do século XX, um poeta do modernismo, completamente fora do contexto histórico, mas na literatura infantil, o tempo perde a sua validade. Após a leitura da poesia, o rei anuncia-lhe que casará com ela, obedecendo a um pedido da sua mãe.

A princesa, apavorada, pede auxílio a fada Lilás, uma fada irônica, de bom humor, misteriosa, conhecedora do futuro. O conselho da fada compõe-se de três desafios ao rei: Ela casará se o pai lhe conseguir um vestido feito de tempo. Os costureiros da corte conseguem fazê-lo. Ela pede, também, um vestido feito de nuvens. Novamente os místicos costureiros o fazem. Ela pede, então, um casaco com a pele do asno que está no estábulo. O rei manda matar o pobre do asno, a garantia econômica do reinado e a segurança o sistema político.

VII – A fuga
Seguindo o Conselho da fada Lilás, a princesa foge em direção do povoado arrumando trabalho de crida na casa de uma mulher horrorosa, uma mistura de gente e bruxa. No vilarejo ela conhece o príncipe do reino dos Vermelhos, que se apaixona por ela, mesmo vestindo a pele de um asno. Ela corre com o príncipe pelos campos, pelos jardins floridos, sempre seguindo a direção do sol. Em casa, ela faz um bolo para o príncipe, no entanto, derruba seu anel na massa do bolo. O príncipe a procura por todos os lugares, não a encontra na corte e no Vilarejo. O rei, seu pai, convoca todas as donzelas do império para experimentar o anel. A donzela que possui os dedos que identifiquem com a dimensão da joia, será a nova rainha. Perrault, no conto “Pele de Asno”, substitui o sapatinho de cristal pelo anelzinho de ouro.

No casamento do príncipe com “Pele de Asno”, a ruptura com a linearidade temporal chega ao ápice, pois o rei sobrevoa o local de casamente num helicóptero, para acompanhar o enlace da filha.
Meus leitores, no filme “Pele de Asno”, as cenas nos remetem ao Antigo Testamento, ao Gênesis, mais especificamente. Nós todos conhecemos o momento em que Deus, todo poderoso, faz para o homem e para a mulher, roupas de peles de animais, como o casaco de pele de asno.

Neste mundo de sonhos, ilusões, nós sempre procuramos o nosso príncipe encantado. Sonhei muito com ele, mas não precisei procurar por fadas nem esconder um anel em um bolo para que ele me encontrasse, mas uma ajudinha nunca é demais. Por isso lhes oferto a receita do bolo Pega Marido.

Receita

BOLO PEGA MARIDO

Ingredientes: 3 ovos inteiros; 1 vidro de leite de coco; 300ml de leite integral; ½ xícara (chá) de açúcar cristal; 1 caixinha de leite condensado; 3 colheres (sopa) de manteiga; 1 e ½ xícara (chá) de farinha de trigo

Modo de preparo: Como a característica principal desse bolo é a cremosidade, então precisamos de uma massa muito líquida. Então, não precisa se preocupar com a consistência final dela, porque é isso mesmo. O modo de preparo é bem rápido. Coloque todos os ingredientes no liquidificador e bata por aproximadamente 5 minutos. Quando estiver uma mistura bem homogênea, desligue o liquidificador e transfira essa massa para uma forma com furo no meio untada e enfarinhada. Após você finalizar com a decoração a gosto, ficará simplesmente lindo! Leve para assar em forno preaquecido a 180º por aproximadamente 1 hora. Pode ser que leve mais tempo, pois depende muito da potência do forno. Mas para saber se está bem assado é só observar a cor. Quando estiver bem dourado por cima, pode desligar o forno!

Por Adriana Padoan