I – Revolução Francesa
Há acontecimentos no mundo que, inevitavelmente, são deslocações do universo. Esse meu pensamento é muito simples, mas mostra a vida da França lá pelos anos de 1780.
Sabemos que a história funciona como um copo sobre a mesa. A água vai sendo derramada dentro do copo, ele vai aguentando, resistindo, até que num momento qualquer, há o transbordamento sem impedimentos possíveis, tudo derrama, espalha-se, cai no chão.
Assim, o que pretendemos mostrar é que na França de 1889, o povo passava fome, não tinha escola, a saúde se resumia a um fiapo, a morte era a realidade de todos os dias. No meio de tudo isso, alguns jovens lançaram um movimento chamado iluminismo, um conjunto de ideias, que derrubaram o poder, o rei, a rainha, os nobres; o povo saiu às ruas e tomou o poder, realizando um dos maiores movimentos sociais surgidos na história da sociedade. Um desses jovens revolucionários que na estampa do seu rosto, o coração ajudou a compor o iluminismo, colocar a revolução na rua, assinava Voltaire.
A sua cabeça era formada pelo conceito de liberdade, o valor de cada ser humano, a dose de tolerância diante da ignorância, à pureza e a carícia na pela da mulher amada. Voltaire foi preso, exilado, perseguido, odiado, mas, na sombra que havia nas arvores da rota de fuga, conseguiu escrever uma história de amor, de crítica social, de cirurgia na política, chamado “Candido ou o otimismo”, escrito em 1759.
O que causa um certo núcleo de interesse de todas as pessoas que gostam de cinema e, busca de lanterna na mão a justificativa de como a obra Candido, de 1759, escrita por um artista, filósofo, que impulsionou a Revolução Francesa, chega ao Brasil, aos estúdios da Vera Cruz, embrenhando-se na alma do artista Mazzaropi, um artista nascido nos gestos de amor dos brasileiros.
Eu pensei, sondei a mim mesma, olhei para a biblioteca, para os astros distantes e resolvi dar uma passada pelo mundo de Voltaire, ler o seu Candido.
II – Candido de Voltaire
Voltaire narra a história de um jovem chamado Candido, vivendo em um lindo palácio, recebendo ensinamentos de otimismo do filósofo Leibniz através do professor Pangloss. A base desses ensinamentos apresenta a teoria de que vivemos o melhor dos mundos possíveis.
Um dia, no interior desse bem, Candido é expulso do palácio por ter trocado com Cunegundes, filha do barão, um beijo.
Candinho anda sobre o mundo e descobre a cada passo dado, que a decepção é o norte dessa enorme bola cheia de mapas que se chama mundo. Observa a violência, reencontra o professor Pangloss doente, sifilítico; Cunegundes fora estuprada pelo exército búlgaro. Essa mentira é dona de uma utilidade, levar-nos a desacreditar de todos os ensinamentos recebidos.
Depois descobre que a sua amada tornara amante de um inquiridor. No final, após viverem mil aventuras, Candido casa-se com Cunegundes. Na obra de Voltaire, levando em conta a sua condição de filósofo, o personagem Candinho representa todas as mudanças sociais da transição do sistema econômico medieval para o capitalismo do século XVIII.
III – O Candinho deMazzaropi
O roteiro foi escrito pelo diretor e roteirista Abílio Pereira de Almeida, um intelectual dramaturgo, diretor, ator e um dos fundadores da Vera Cruz.
A história parte do ano de 1926, ocasião em que Getúlio Vargas é empossado como Deputado Federal, um período de transição política, econômica e social nos trópicos. O espaço inicial é a fazenda Dom Pedro II, representante do passado imperial brasileiro. O proprietário da fazenda é o monarquista Quinzinho, nome marcado pelo diminutivo, posicionando-o no quadro político do momento. Quinzinho e sua esposa não tinham filhos. Nesse dia, porém, as arvores acordaram sem derrubar uma única folha, os pássaros não levantaram voo, os animais pisaram a terra grávida de uma profecia. O riacho, mesmo estreito tendo suas águas embebidas em argila de segunda classe, trouxe um cesto na movimentação de sua correnteza, com um garotinho recém-nascido dentro.
A cena remete-nos à história de Moises, personagem bíblico, um navegante em direção ao castelo do poderoso faraó.
No caso do nosso personagem, as lentes das câmeras cinematográficas unem a sua chegada ao meio religioso e ao Candido de Voltaire. O diminutivo do nome nos leva em direção à inocência, a candura, a pureza, ao nosso processo colonial, religioso, e a busca de um lugar na sala ou na cozinha das grandes nações.
Durante alguns anos Candinho arrebata à atenção dos moradores da casa. Nós sabemos que a história muda o curso da vida; Quinzinho torna-se pai de um casal de filhos, Quincas e Filoca. O Candinho, sem levar em conta as horas e os relógios, é convertido ao escravo branco da casa. Mora numa casinha idêntica à morada do Jeca. Tira o leite, planta, colhe, serve o almoço e o jantar. A aproximação com o texto de Voltaire ocorre nos seguintes fatos: Filoca gosta de Candinho, há um hospede do coronel chamado professor Pancrácio interpretado por Adoniram Barbosa, um protótipo caipira do professor Pangloss de Voltaire.
A mocidade de Candinho se conduz pelo cotidiano que nasce e morre. Duas referencias, no entanto aproximam os dois textos – A filosofia de Candinho: “Tudo que acontece de ruim é para melhorar a vida da gente”, nascida na boca do personagem Pangloss de Voltaire e repetida pelo professor Pancrácio. No contexto da história, há um medalhão que veio com o Candinho criança, funcionando como ponto de contato com a sua origem.
Os fatos que demonstram o intertexto entre as duas obras acontecem de forma simples e quase idênticas: Candinho dá um beijinho em Filoca. A cena é vista por Quinzinho que, sem pensar, expulsa Candinho da fazenda. O personagem parte para São Paulo, levando o seu burro Policarpo, seu medalhão e o desejo de encontrar a sua mãe.
Em São Paulo vive mil aventuras, tenta sobreviver na capital esmagadora; encontra um amigo abandonado como o próprio Candinho; encontra o professor Pancrácio, vivendo de esmola, um pedinte de esmola profissional; reencontra Filoca trabalhando numa boate como mulher de programa. Em uma noite paulista, Filoca encontra um mapa escondido no interior do medalhão. Todos retornam a cidade de Piracema, encontram o tesouro apontado pelo mapa. Esse achado coloca Candinho na situação de milionário, casa-se com Filoca, o professor Pancrácio casa-se com dona Eponina, tia de Filoca, e o mundo se encaixa nas possibilidades da vida. Candinho, um caipira medieval rompe a fronteira da estagnação econômica do país, sem ter consciência do fato, mas torna-se um capitalista.
A filosofia do professor Pangloss de Voltaire, ou seja,”cada vez que o universo muda o rumo das coisas, é sempre para melhorar”.
Após o término do filme Candinho, uma flor pintada de sonho, voou em direção a algum lugar. E a Vera Cruz, produtora de fantasia, desenhada pelos ângelus, faliu. Fechou, em silêncio, as suas portas.
Receita
FRANGO COM QUIABO E POLENTA
Ingredientes: 1 frango inteiro; 1 limão;2 dentes de alhos picados; 4 colheres de sopa de óleo; 1 colher de sopa de colorau; 1 cubo de caldo de galinha; 1 xícara de molho de tomate; 3 xícaras de água ou caldo de frango quente; 1 quilograma de quiabo fresco; salsinha picada a gosto; pimenta do reino; sal
Para a polenta: 1½ xícaras de fubá para polenta; 5 xícaras de água (1200 mililitros); 1 cubo de caldo de galinha; 2 colheres de sopa de manteiga
Modo de fazer:
Prepare esta receita de frango com quiabo cortando o frango em pedaços (à passarinho) e temperando com o suco de limão, os alhos, sal e pimenta.
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Coloque o óleo e o colorau numa panela e leve ao fogo. Quando o óleo estiver quente acrescente os pedaços de frango e cozinhe, virando de vez em quando, até dourarem de todos os lados.
Dissolva o caldo de galinha na água e junte à panela, para começar a formar o caldo da cozedura. Cozinhe por 20 minutos em fogo médio. Depois junte o quiabo lavado e picado, o molho de tomate e o cheiro-verde, misture e deixe ficar por mais 10 minutos ou até observar que a carne está pronta.
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Enquanto isso aproveite para preparar a polenta desta receita de frango com quiabo e polenta. Coloque o fubá hidratando em metade da água, um truque para não empelotar na hora de levar ao fogo. Coloque o restante da água numa panela com o cubo de caldo e a manteiga e leve ao fogo.
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Quando a água que está no fogo ferver junte o fubá hidratado pouco a pouco, enquanto mexe com um fouet. Fique mexendo por mais 10-15 minutos ou até virar uma polenta macia e cremosa. Tempere a gosto com sal e desligue.
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Está pronto seu frango com quiabo e polenta! Sirva em seguida, enquanto está quente.
Por Adriana Padoan