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terça-feira 12 novembro 2024
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Comilanças Históricas e Atuais – 12 Anos de escravidão: uma faixa temporal

I – Escravo
As mãos de Noé adentravam a pele da terra. As mudas da vinha sentiram o calor da vida em suas raízes. Após o surgimento da lua, várias vezes no céu, os cachos de uva penduraram-se sobre a origem da própria existência. Noé fez o vinho. Bebeu além dos limites. Embriagou-se como as correntezas do rio. Tendo na cabeça, um mundo de ilusões desconectadas e, por isso, tirou a roupa e nu, cantou e dançou sobre um mundo entre a realidade e o improvável.

Cam, filho de Noé,
Pai de Canaã, viu a nudez do pai.
Avisou os irmãos Sem e Jafé.
Os dois irmãos sabedores da situação e aflições do pai,
Fecharam os olhos, e cobriam o corpo do genitor.

Quando Noé retornou do seu delírio e, pelo sentido das palavras na profundidade das notícias, soube do acontecido, e da atitude do seu filho mais novo, disse uma série de vocábulos que envergonhou a terra:

“Maldito seja Canaã!
Que ele seja, para seus irmãos,
O último dos escravos!”

II – Início do processo de escravidão moderna
Os portugueses, adoradores do mar, deram o início ao processo de escravidão moderna, lá pelos anos de 1444, comprando negros na África, e os revendendo para servirem de força de trabalho, não assalariada, para a colonização das Américas. Falando-se em termos sociológico, os traficantes de escravos criaram o chamado triângulo econômico, sem levar em conta a presença de elementos abstratos que, sem dúvida, condenariam a falta de sensibilidade e a ganância do poder. A força derivada da ausência de humanidade, organizou a metodologia escravocrata, da seguinte forma:

O local de captura de escravos,
Seria a África.
Nas Américas, ainda em forma de sonho,
Aconteceria a compra, a troca, o sistema de trabalho,
E, também, a produção de bens vendáveis.
A Europa, gananciosa, perfumada,
Venderia as riquezas,
Produzidas pelo trabalho negro.
Com o lucro, empreenderiam,
Novas viagens a África,
Para o reabastecimento da mão de obra escrava.

III – A arte
As noites chegavam nos horários de sempre. As luzes produzidas pelos homens, multiplicadas pelas cores suaves ou atrevidas, iluminavam a chamada vida noturna. A literatura aproveitava o momento, invadindo o corpo, a alma, o espírito, do escritor e advogado David Wilson. Ele segurava o seu lápis, ajeitava as folhas de papel em branco e, sem pedir licença, abria as portas da escravidão americana que, atingida pela vergonha, vivia escondida numa toca profunda e adimencional, de cabeça baixa, olhos cor de fogo, digerindo os gritos de dor de um passado impossível de ser esquecido ou arquivado. Foi de lá, desse despenhadeiro que Wilson produziu o livro “12 Anos de Escravidão”.

IV – As consequências
A mulher do diretor de cinema Steve MacQueen, leu o livro “12 Anos de Escravidão”, durante uma semana. Ao terminar a leitura, sentiu a presença de um raio arrebentando o seu estado emocional.

Passou o livro ao seu marido, o diretor cinematográfico Steve MacQueen, que o leu como se estivesse num set de filmagem, um espaço escolhido pela produção de um filme, para a gravação das cenas, contendo os elementos necessários para a produção de um longa metragem e, além dos equipamentos, cenários, todos os talentos artísticos envolvidos com a realização das cena. O coração de MacQueen ficou atordoado, a impressão momentânea foi a de uma elevação estelar; num estalo, transformou sua paixão pelo livro num filme encorajador e crítico sobre a escravidão e a evolução americana.

V – Fome, angústia
Ele sentiu a voz da violência, a maldade que abita o corpo de um homem histórico ou não. Os seus ouvidos captaram os desesperos das cenas de tortura, o flagelo num tronco, numa árvore, a invasão causada pelo estupro, privações e a angústia causada pela fome.

Ele foi amarrado, preso à história de Solomon, elementos que geraram o filme. Em seus sonhos no mundo dos acordados, dos despertos; escolheu como realidade para que os pés sentissem o sangue ressecado no contexto da estória de Solomon Northup, personagem central do livro, da história, do contexto social, da conquista heroica marcada pela Estátua da Liberdade.

Como diretor, procurou o lugar, o espaço, onde as lágrimas de Solomon umedeceram as samambaias; encontrara esse lugar nas imediações de Red River, Estado da Lousiana. Na proximidade com o espaço real, suas forças aceleraram todas as amarras da narrativa e da emoção. Ele estava filmando onde a história acontecera e o aroma da terra pairava acima da criatividade.

VI – O enredo
O diretor entregou a responsabilidade do enredo ao profissional John Ridley que, nos seus instantes marcou o texto com a transmissão do desespero, levando o público ao sonho da esperança tardia e da emoção. O histórico não realiza o trabalho de transformar a escravidão mais real; ele cria uma verdade psicológica ao unir o acidente acontecido ao personagem central que nunca foi comum naquele país. O enredo nos leva a fixar, assustar-se com o tamanho da população negra, com os problemas de saúde mental, de tortura, de humilhação, que nos carrega pelos braços da vergonha, de um certo embaraço, de um estranho mal-estar, de uma potência que vive hoje como nação poderosa, mas construída sobre o seu passado infeliz e irracional.

VII – Solomon
A história de Solomon, seja no livro, no enredo, no filme, por mais dilacerante que se apresente, foi real, faz parte de um pedaço da grande história americana, e joga nas nossas narinas o cheiro fortíssimo da escravidão, que os americanos tentam pintar de outras cores.

O seu nome de nascimento Solomon Northup, sua identidade como homem negro, nascido nos Estados Unidos, na época da escravidão, e, por descendência familiar nasceu livre. Era músico por profissão, trabalhava como violinista no chamado Distrito de Satosa, em Nova York. Vivia com a esposa e dois filhos. A vida do artista, como é do conhecimento da maioria das pessoas, não se projeta na exatidão normal da vida e do trabalho. Assim, um dia, irmão gêmeo de muitos outros dias Solomon recebeu a visita de dois agenciadores de apresentações, shows, atividades que eram comuns em festas particulares.

VIII – Sonho artístico
Os dois desconhecidos ofereceram-lhe emprego, em uma espécie de circo, em Washington, por um período de duas semanas recebendo como salário uma pequena fortuna. Solomon analisou a vida, o lucro, a possibilidade de visitar a família e por isso acabou aceitando.

IX – Tráfico negreiro
Assim que os três homens chegaram ao futuro local de trabalho, sendo contratadores e traficantes de negros por profissão, o embriagaram, drogaram-no, acorrentaram-no as suas mãos e as suas pernas, roubaram as suas roupas e o jogaram numa senzala fétida, de propriedade de um homem famoso no submundo de um tempo, chamado James Burd, um rico vendedor e chefe do tráfico local. Solomon devido ao ineditismo dos acontecimentos, não está de posse de um documento que consiga provar que é um homem livre.

X – Da liberdade à escravidão
Essa transgressão em sua vida, essa mudança de rota em seu presente e no futuro representado por cores assustadoras; esparramou neblina no íntimo do seu coração destruindo as hipóteses existenciais de quem nasceu livre, viveu o sangue pulsante da liberdade; o amor brincando na profundidade dos seus direitos; sentir-se condenado na rapidez de um momento e, na brutalidade de um processo econômico desapiedado, ser transportado pela violência de um vendaval, à condição de um escravo historiografado por um calendário apagado, produz a imagem de um rio sem margem, sem correnteza, sem navegação, sem nada de nada, possuindo apenas, a desesperança de si mesmo, a incerteza transparente de uma pedra de gelo sem origem definida.

XI – Escravidão e fé
Solomon é vendido para um fazendeiro regido por um catolicismo atrofiado pela sua própria incompreensão do livro bíblico. As cenas são marcadas pela violência do sangue, lágrimas, medo, coragem, determinação e filmadas pela carne viva, pelo suor sofrido, pela dor não merecida.

No confronto entre pessoas Solomon é vendido para um fazendeiro plantador de algodão no estado de Lousiana, onde atravessa o seu calvário de todos os sois, de todas as chuvas e o temor do calor infernal.

XII – A psicologia e o público
O filme faz e provoca uma transformação mental no público assistente, colocando-o como testemunha do drama mortificante que foi a escravidão e o horror da sua capacidade de perfurar a pele do público, impedindo-o de colocar a racionalidade numa condicional: Será que somos simplesmente gente? A sensação transmitida neste filme, é a de que somos apresentados ao perfil mais cruel da violência humana.
Solomon apanhou, foi chicoteado, humilhado, viu a morte cara a cara, mas jamais tirou da cabeça a sua origem. Usando a voz da amizade, de pessoas brancas que trabalharam com ele consegue sua liberdade de volta e retorna para sua casa sentindo, com muita força, que existe em algum lugar do universo o poder da justiça.

RECEITA

S’MORES DE FORNO

Ingredientes: 250 gramas de chocolate meio amargo; 150 gamas de biscoito de maisena ou outro de sua preferência; 250 gramas de marshmallow do tipo “camping”.

Modo de preparo: Reúna os ingredientes e prepare esse s’mores de forno, uma combinação de cremosidade, crocância e sabor. Em uma tábua, utilize uma faca e pique o chocolate em pedaços menores para facilitar o derretimento. Derreta o chocolate no micro-ondas de 30 em 30 segundos (ou em banho-maria). Transfira o chocolate derretido para uma travessa refratária distribuindo por todo o fundo; em seguida coloque os marshmallows inteiros em cima da camada de chocolate derretido e leve ao forno preaquecido a 200ºC até eles começarem a dourar. Sirva o s’mores quentinho em uma noite de filmes com os amigos e utilize as bolachas para pegar o chocolate e marshmallow derretido. Bom apetite!

por Adriana Padoan