• Jane Martins Vilela – Cambé/PR
“… Se teu irmão pecar contra ti, vai, e corrige-o entre ti e ele somente; se te ouvir, ganhado terás a teu irmão. Então, chegando-se Pedro a ele, perguntou: Senhor, quantas vezes poderá pecar meu irmão contra mim, para que eu lhe perdoe? Será até sete vezes? Respondeu-lhe Jesus: Não te digo até sete vezes, mas setenta vezes sete vezes.” (Mateus, XVIII: 15, 21, 22.)
A dificuldade de perdoar as ofensas ainda é uma das grandes dores da humanidade sofredora. O orgulho mostra suas pegadas nesses episódios de dor, que são uma sombra que ainda se estende na Terra. Há que deixar os clarões de luz do amor dissiparem as sombras e iluminarem as trevas. Trevas interiores, dolorosas, que precisam ser sanadas.
Perdoar é divino. Nessas horas em que tantos revelam suas angústias, provocadas pelo egoísmo humano, gerador dos males no mundo, há que se lembrar de edificantes casos anônimos, que nos ajudam a meditar em nosso próprio crescimento.
Algum tempo atrás, não muito tempo, por sinal, ouvíamos uma palestra de uma senhora, professora universitária aposentada, no Centro Espírita que frequentamos em Cambé.
Enaltecia ela as qualidades de seu pai, espírita, homem de bem, que lhe passou valores sólidos das virtudes e uma vivência como a do verdadeiro espírita retratado n’O Evangelho segundo o Espiritismo. Disse ela que ele tinha sido motorista de táxi numa cidade pequena e que tinha sido assassinado por ladrões. Enquanto ela falava das qualidades de seu pai, como homem de bem, nós pensávamos: Será que essa senhora é a citada no livro “Abnegado Servidor” que conta os casos e experiências de Hugo Gonçalves, saudoso amigo e espírita modelo?
Prestando atenção no que ela falava, também fomos lembrando o caso narrado no livro e que Hugo Gonçalves tinha mantido no anonimato, para preservá-la. Foi um dos maiores exemplos de perdão que pudemos presenciar nessa encarnação.
Ao terminar a palestra e irmos cumprimentá-la pelo brilhantismo da explanação, em particular, a sós com ela, lhe perguntamos se a situação contada no livro se referia a ela. Humildemente ela disse que sim e nós pudemos pessoalmente agradecer-lhe pelo ensinamento deixado. Ficou entre nós sua identidade no fato que Hugo tão bem descreveu como marcante e belo para ele.
Disse Hugo que certa ocasião uma jovem foi procurá-lo e contou-lhe sua história, que lhe revelou a grandeza moral dela. Seu pai era motorista de táxi e houve um roubo e morte do taxista, com posterior perseguição da polícia.
Um dos ladrões foi seriamente ferido enquanto o outro não resistiu aos ferimentos. O jovem sobrevivente confessou que foi ele o autor do crime. Foi internado na época no Hospital Universitário de Londrina, em estado grave. Quando melhorou foi transferido para uma enfermaria isolada. A polícia montava guarda na porta do quarto. Um dia, no horário das visitas, essa jovem foi visitá-lo. Ninguém ia visitá-lo, nenhum parente, pois ele era de outra cidade.
Ao chegar à porta, a jovem perguntou ao guarda se era permitida visita e esse disse que sim, mas que precisava verificar sua bolsa, para ver se ela não portava alguma arma para ele.
A jovem, sorrindo, disse que portava a mais poderosa de todas as armas. E mostrou-lhe “O Evangelho segundo o Espiritismo”. Visitou o rapaz todos os dias. Lia para ele “O Evangelho”. Pegou seu endereço, escreveu para a família dele, deu notícias, disse que ele estava bem. Foi todos os dias vê-lo. O rapaz então, um dia, chorando lhe disse que ele estava mudado, que se soubesse antes aquilo que sabia com o contato com ela, jamais teria cometido o crime. Estava arrependido. Quando teve alta do hospital e prestes a ser transferido para a prisão, agradeceu muito a ela. Foi a única visita que recebeu. E mudou seu modo de pensar. Ela despediu-se, deu a ele de presente “O Evangelho segundo o Espiritismo” e se retirou sem que ele soubesse, nem a sua família, que ela era a filha do motorista de táxi que havia sido assassinado.
Durante muitos anos meditamos nessa história. Pensávamos se fôssemos nós, no lugar dessa jovem. Será que teríamos essa capacidade que ela teve? Não sabemos. Somente a experiência revela o saber. O que sabemos é que foi de profunda grandeza essa atitude dela. Um Espírito que entendeu e viveu o perdão.
Tivemos a oportunidade de conhecê-la pessoalmente, agradecidos a ela pelo ensinamento, mais de 25 anos após conhecer esse fato.
São os anônimos do mundo, conhecidos pelo Cristo de Deus, por cumprirem seus ensinamentos.
Nessa hora em que o perdão se faz necessário em tantos corações, bom lembrar esse fato e esse exemplo verdadeiro de caridade para com o próximo.
Lembramos aqui nestas linhas, de um texto constante d´O Evangelho segundo o Espiritismo, de Elizabeth de França – Caridade com os Criminosos -, em que ela diz:
… Aproximam-se os tempos, ainda uma vez vos digo, que a grande fraternidade reinará sobre o globo. Será a lei do Cristo que regerá os homens. Somente ela será o freio e a esperança, e conduzirá as almas às moradas dos bem-aventurados. Amai-vos, pois, como os filhos de um mesmo pai: não façais diferenças entre vós e os infelizes, porque Deus deseja que todos sejam iguais: não desprezeis a ninguém. Deus permite que grandes criminosos estejam entre vós, para vos servirem de ensinamento. Brevemente, quando os homens forem levados à prática das verdadeiras leis de Deus, esses ensinamentos não serão mais necessários, e todos os Espíritos impuros serão dispersados em mundos inferiores, de acordo com suas tendências.
O amor um dia há de triunfar na Terra.
Até lá, casos como o dessa senhora são lições de amor para nós. Que possamos aprender com elas e amar um pouco mais.