• Cláudio Bueno da Silva – Osasco/SP
Você já se deparou com uma situação assim: está distraído, com o olhar meio vago, quando percebe uma pessoa olhando para o seu lado com cara esquisita? Depois ela vira o rosto naturalmente, mas você, na fração de segundo que passa, capta uma estranheza naquela fisionomia?
Aconteceu um dia desses com o Esteves. Viajava ele de metrô, ia lendo um livro espírita e de vez em quando o fechava para refletir sobre o que lia. Numa dessas vezes em que ergueu a cabeça, observou uma senhora com os olhos na sua direção fazendo uma espécie de careta, que a princípio não tinha nenhum significado. Talvez antes que os seus olhos se cruzassem, não se sabe, ela desviou o rosto para outra coisa.
Apesar da circunstância fortuita que pode acontecer com todas as pessoas e em muitas ocasiões, Esteves fechou o livro e começou a se fazer perguntas: “Será que é comigo? Não gostou da minha cara? Percebeu que leio um livro espírita e isso a importunou? Quem sabe odeia o Espiritismo?! Com tanta gente no vagão, logo eu!…”
E foi por aí, deixando o pensamento percorrer um caminho que não levava a lugar algum. Fez ilações inúteis, e mais, interrompeu a leitura que vinha lhe dando tanto prazer até aquele momento.
Não demorou muito, o carro parou e Esteves notou que a senhora, ao virar-se para descer, fez idêntica careta, sumindo na multidão de passageiros que também saltavam.
Num estalo Esteves caiu em si, e meio envergonhado concluiu que a ocorrência nada tinha a ver com ele. Possivelmente aquela senhora nem notara a sua presença. No exato instante em que olhou para onde ele estava talvez tenha se lembrado de um problema chato a resolver, ou sentido uma fisgada na coluna, quem sabe? E se tivesse um cacoete? Teria perdido um ente querido recentemente e o esgar facial traiu a lembrança que lhe passou pela alma? Pensou numa contrariedade familiar, as notas baixas de um filho rebelde, por exemplo… Tanta coisa, meu Deus, pode ter passado naquela cabeça, naqueles segundos… E ele chegou a se incomodar com uma simples ilusão…
Esse episódio rápido e vulgar, ocorrido num vagão do metrô, deu a Esteves duas lições. Primeira: não julgar pelas aparências. Nem sempre o que se vê é a realidade. O aspecto exterior quase nunca fala da essência. Segunda: não levar para o lado pessoal, não tomar para si, não relacionar diretamente a si tudo o que se ouve ou vê. Podemos conhecer as nossas razões, mas ignoramos as razões dos outros.
Agindo assim – Esteves refletiu –, não se corre o risco de envolvimento mental ou pessoal em assuntos com os quais não se tem a menor relação e não nos dizem respeito, evitando conflitos e aborrecimentos.
A viagem ainda durou mais um pouco, e assim que chegou sua estação Esteves desceu com naturalidade, procurando não olhar diretamente para ninguém.