• Antônio Carlos Navarro – São José do Rio Preto/SP
– “Seo” Navarro, estou terminando o supletivo do segundo grau, e vou “fazer” faculdade.
Quando escutei isso do meu amigo João, confesso que fiquei surpreso. Afinal, não é muito comum alguém com mais de sessenta anos voltar-se para o estudo e, menos ainda, cursar faculdade. Sem contar que ele estava na condição de encarcerado em ambiente prisional de nossa cidade, em regime semiaberto.
Nossa amizade surgiu durante os trabalhos de Evangelização Carcerária. Ele sempre respeitoso e servil, havia se envolvido nos cuidados do ambiente ecumênico onde acontecem as explanações religiosas semanais, e demonstrava, com simplicidade natural, uma jovialidade invejável.
Certa feita, ao nos reencontrarmos em mais uma oportunidade que a escala dos expositores me permitia, ele me informou que já estava cursando as aulas do primeiro ano de Direito.
Sempre confiante, estava determinado a conhecer os limites de suas forças, e caminhar até onde a vida o permitisse. Nunca o vi desanimado, e muito menos reclamar do que quer que fosse.
Eu acompanhava o seu desenvolvimento com a distância que a situação permitia, e qual não foi minha surpresa quando fiquei sabendo que uma tumoração maligna havia surgido em uma de suas mãos, resultando em amputação da mesma na altura do antebraço. Ainda assim, o seu estado de espírito não se arrefeceu.
Aprendi muito com ele, em especial a questão da liberdade, o que me fez meditar sobre os esclarecimentos constantes em O Livro dos Espíritos (1), em especial no item oitocentos e trinta e três:
“Haverá no homem alguma coisa que escape a todo constrangimento e pela qual goze ele de absoluta liberdade?
“No pensamento goza o homem de ilimitada liberdade, pois que não há como pôr-lhe peias. Pode-se-lhe deter o voo, não aniquilá-lo.”
Analisando o comportamento do meu amigo João notei que ele, naturalmente, embora na condição de encarcerado, vivia a vida com uma liberdade espiritual muito mais ampla do que a minha.
Enquanto “homem livre” eu vivia, hoje menos graças a ele, preso a preconcepções, com pontos de vistas engessados, acomodado às limitações que me impunha, com algum pessimismo entendido e alimentado como precaução; ele, presidiário, vivia livre, voando espiritualmente enquanto seu corpo obedecia a “Leis dos Homens”.
Eu livre nunca criei condições para cursar faculdade, ele idoso e preso formou-se em Direito. Não é para se pensar?
Hoje em liberdade, depois de ter cumprido com a sentença que lhe foi determinada, vez ou outra o encontro, e o vejo com a mesma liberdade íntima de sempre. Uma questão de entendimento e postura.
Ah, sabe aquela palavra do Senhor Jesus “estive na prisão, e foste me ver” (2)? Pois é, graças a ela é que experimentei a maior lição sobre liberdade de minha vida, e até hoje estou tentando tirar proveito dela.
Salve, Doutor João, meu Amigo e Benfeitor. Muitíssimo obrigado pela lição.
Referências:
(1) Allan Kardec, O Livro dos Espíritos, 3ª Parte, Capítulo X;
(2) Mateus 25:36.
Coluna Espírita – João: Uma lição sobre a liberdade
jun 01, 2023RedaçãoColuna Espírita (Agê)Comentários desativados em Coluna Espírita – João: Uma lição sobre a liberdadeLike