• Cláudio Bueno da Silva – Osasco/SP
Jesus falava à mulher samaritana sobre “a água viva que sacia toda sede”, pois “vem do amor infinito de Deus e santifica as criaturas”, quando esta, empolgada com os ensinamentos novos que ouviu, afastou-se do poço onde retirava água e chamou familiares e vizinhos para que o ouvissem também.
Nesse momento Filipe, Tiago e André, que haviam deixado Jesus para ir buscar alimentos num vilarejo próximo, retornam trazendo atrás de si muitos populares, que se acomodaram por ali, discutindo sobre as questões palpitantes que aquele nazareno trazia.
Enquanto conversavam, os discípulos se mostravam preocupados com o Mestre, insistindo para que se alimentasse. “Meu alimento – respondeu Jesus – é fazer a vontade daquele Pai misericordioso e justo que a este mundo me enviou, a fim de ensinar o seu amor e a sua vontade. Meu sustento é realizar a sua obra”.
Diante do falatório da pequena multidão, os discípulos se mostravam entusiasmados com a repercussão que os ensinos causavam entre aqueles samaritanos.
– “Não é isso propriamente o que me interessa”, disse Jesus. “O êxito mundano pode ser uma ondulação de superfície …Acaso poderemos admitir que já somos compreendidos?”
Olhando para a turba, propôs aos discípulos: – “Ouçamos o que dizem nossos seguidores”.
– “Acreditas que seja este homem o Cristo prometido? – perguntava um samaritano de boa figura aos seus amigos. – De minha parte, não aceito semelhante impostura. Este nazareno é um explorador da piedade popular.
– É certo – concordava o interpelado –, mesmo porque, em sua terra, não chega a valer um denário. Pelos próprios parentes é tido como inimigo do trabalho e há quem duvide da sua preguiçosa cabeça.
– É um louco de boa aparência – dizia uma mulher idosa para a filha –, pelo menos essa é a opinião que já ouvi de habitantes de Cafarnaum; entretanto, cá para mim, acredito seja um grande velhaco. Por que se meteu com pescadores, quando alega ser tão sábio? Por que não se transfere para Jerusalém, ou mesmo para o Tiberíades? Bem sabe a razão disso. Lá encontraria homens cultos que lhe confundiriam a presunção.
Mais próximo de Jesus, um rapaz sentenciava em voz discreta:
– Quando chegamos, foi ele achado sozinho com uma mulher. Que te parece esta circunstância? – perguntava a um companheiro de caminhada. – Certamente desejava salvá-la a seu modo… – replicou com malicioso riso o inquirido.
Num grupo vizinho, falava-se acaloradamente:
– Este homem é um espertalhão orgulhoso – dizia, convicto, um velhote –, só faz milagres junto das grandes multidões, para que sintam virtudes sobrenaturais nas suas mágicas.
– E não tem caridade –, acrescentou outro.”
André, Tiago e Filipe estavam espantados com o que tinham ouvido. O êxito era aparente, mas real a funda incompreensão do povo.
– “Esta é a imagem do campo onde temos de operar. Por toda parte encontraremos samaritanos discutidores, atentos aos êxitos e referências do mundo”, disse o Mestre aos discípulos, que se acomodavam em breve descanso, enquanto a noite começava a cair.
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Um texto forte que mostra o vício do julgamento indevido e infundado do populacho de todos os tempos sobre as questões mais graves. Nele, Jesus é nivelado aos impostores, interesseiros, exploradores, mesmo tendo impressionado multidões com suas palavras e atos de compreensão e amor.
Dois mil anos após, e os fariseus, samaritanos, ou o que quer que sejam, ainda pululam pelo mundo, destruindo reputações, defendendo interesses próprios, aparentando beatitude, depreciando valores sagrados.
Este é o campo onde têm de operar os que já se preocupam e querem trabalhar pela vitória do bem no mundo.
(Texto baseado no capítulo 17, “Jesus na Samaria”, do livro Boa Nova, pelo Espírito Humberto de Campos, psicografia de F.C.Xavier, FEB, 1985.) Contém transcrições.