• Jorge Hessen – Brasília/DF
Kardec comenta na edição de dezembro da Revista Espírita de 1863 sobre as etapas do projeto Espírita na Terra. Cita “a primeira etapa como a da curiosidade (mesas girantes), a segunda etapa o filosófico (com a publicação de O Livro dos Espíritos)”; a terceira etapa Kardec nominou de “período da luta”; “o quarto período, o do Evangelho (para alguns começou com Bezerra de Menezes e continuada por Chico Xavier na Pátria do Evangelho); a quinta etapa seria o transitório, e finalmente a sexta etapa (transformação social)”.(1)
Considerando as graduais etapas do projeto espírita na Terra, será que atualmente deveríamos promover (como ocorreu durante a codificação), um diálogo escancarado e direto com os recém-desencarnados, visando obter notícias dos mesmos para seus familiares que aqui ficaram? Quantas pessoas procuram grupos espíritas querendo notícias dos entes que “partiram”? Será que a finalidade da mediunidade é essa?
Há “espíritas” (pasmem!) que “orientam” médiuns através de cursos “avançados” ensinando algum tipo de “técnica” para “receberem recém-desencarnados”. Tais “mestres de Espiritismo” afirmam com jactância que alguns jovens e outros “formandos” estarão dentro em breve prestando [através do mediunismo] os “serviços” de consolação para os parentes que por aqui ficaram!?!?!?… Acredite se quiser!!!!
O assunto é grave e merece profundas reflexões. Somos dos que desaconselhamos o uso de evocação dos desencarnados, sobretudo se o médium estiver voltado para a recepção de notícias póstumas de sofredores (normalmente recém-desligados do físico), pois em todos os casos a espontaneidade é essencial para a credibilidade das mensagens.
Chico Xavier nos deixa uma importante lição neste sentido. Recordemos que ante a sua especialíssima tarefa de psicografia ele era alvo de inúmeros pedidos de familiares aflitos para receber notícias dos parentes falecidos. O Médium de Uberaba sabiamente evitava levar nomes para serem evocados para essa finalidade, e se justificava dizendo: “O TELEFONE TOCA DE LÁ PARA CÁ”.
Até mesmo nas mensagens instrutivas não há a necessidade de se fazer uma evocação direta, pois podemos receber mensagens instrutivas de qualquer Espírito evoluído que estiver trabalhando conosco. O mais importante neste caso é o exame racional e lógico da mensagem recebida, conforme ensina Kardec, para se evitar a mistificação.
O extraordinário Espírito Emmanuel, após ser indagado se era aconselhável a evocação direta de determinados Espíritos, esclareceu: “Não somos dos que aconselham a evocação direta e pessoal, EM CASO ALGUM. Se essa evocação é passível de êxito, sua exequibilidade somente pode ser examinada no plano espiritual. Daí a necessidade de sermos ESPONTÂNEOS, porquanto, no complexo dos fenômenos espíritas, a solução de muitas incógnitas espera o avanço moral dos aprendizes sinceros da Doutrina. O estudioso bem-intencionado, portanto, deve pedir sem exigir, orar sem reclamar, observar sem pressa, considerando que a esfera espiritual lhe conhece os méritos e retribuirá os seus esforços de acordo com a necessidade de sua posição evolutiva e segundo o merecimento do seu coração”. (2) (grifamos)
Insatisfeitos com essas sensatas orientações, surgem os kardequeólogos de plantão, fazendo referência ao interesse do mestre lionês pela evocação direta. Entretanto, “precisamos ponderar, no seu esforço, a tarefa excepcional do Codificador, aliada a necessidades e méritos ainda distantes da esfera de atividade de aprendizes comuns” (3), tais quais somos.
Para os phd’s de Kardec (os antiemmanuelinos) informamos que o mentor de Chico Xavier explica: “Qualquer comunicado com o invisível deve ser ESPONTÂNEO, e o espiritista cristão deve encontrar na sua fé o mais alto recurso de cessação do egoísmo humano, ponderando QUANTO À NECESSIDADE DE REPOUSO DAQUELES A QUEM AMOU, E ESPERANDO A SUA PALAVRA DIRETA, QUANDO E COMO JULGUEM CONVENIENTE E OPORTUNO OS MENTORES ESPIRITUAIS”. (4) (grifei)
Para o sábio de Lyon, “frequentemente, as evocações oferecem mais dificuldades aos médiuns do que os ditados espontâneos, sobretudo quando se objetiva obter dos Espíritos respostas precisas a questões circunstanciadas” (5).
Os médiuns – lembra ainda Kardec – “são geralmente mais procurados para evocações de caráter particular do que para comunicações de interesse geral. ELES NÃO DEVERIAM, PORÉM, ACEDER A TAIS PEDIDOS, senão com muita reserva, quando feitos por pessoas de cuja sinceridade estejam seguros. Além disso, é preciso evitar sua participação nas evocações movidas por simples curiosidade ou interesse, sem intenção séria por parte do evocador, afastando-se de tudo o que possa transformá-los em agentes de consultas, em ledores da buena dicha”. (6) (grifamos)
Evocar ou não um Espírito é questão que precisa, portanto, ser bem avaliada, tendo sempre em mente a finalidade a que ela se presta. No livro Conduta Espírita, cap. 25, André Luiz reafirmou a proposta feita por Emmanuel, recomendando-nos seja “abolida, em nosso meio, a prática da evocação nominal dos Espíritos”. (7)
Não tendo havido informações novas, provindas de fontes consagradas, não concebemos porque a recomendação de Emmanuel, reafirmada por André Luiz, deva ser ignorada. A comunicação com nossos entes queridos efetua-se por iniciativa deles. A frase “O TELEFONEMA VEM DO LADO DE LÁ”, dita por Chico Xavier, diz bem como o assunto deve ser encarado em qualquer contexto do debate.
Referências:
(1) Kardec, Allan. Revista Espírita de 1863, Edicel, 1997.
(2) Xavier, Francisco C. O consolador, ditado pelo Espírito Emmanuel, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 2001, Questão 369.
(3) idem, questão 380.
(4) idem, idem.
(5) Disponível em: http://www.oconsolador.com.br/ano2/101/esde.html. acesso em 08/01/2021.
(6) idem.
(7) Xavier, Francisco C. e Vieira, Waldo. Conduta Espírita, ditado pelo Espírito André Luiz, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 2001.