• Rogério Miguez – São José dos Campos/SP
Desde tempos remotos, a Espiritualidade superior tem se mostrado muito preocupada com a questão dos falsos profetas. Textos no Novo testamento são uma prova desta preocupação, tanto de Jesus quanto dos apóstolos. Tudo indica que Espíritos ainda em evolução, como nós, tendemos a acreditar e seguir mensageiros de teorias espantosas e maravilhosas.
Estranhamente, passados períodos de tanta incerteza, onde buscávamos líderes religiosos, profetas, magos, bruxos, gurus e toda sorte de personagens de destaque, para nos orientar como devíamos nos relacionar com Deus, aportamos no século XXI, aparentemente com as mesmas inclinações.
Após a missão de Allan Kardec, com o objetivo de trazer a Terceira Revelação para a humanidade, ainda vemos os que se deixam levar pelo tão conhecido canto da sereia, abdicando da sua capacidade de pensar e discernir, esquecendo-se de ler e estudar as obras do Codificador para saber e conhecer.
Depois da vinda de mensageiros para nos ajudar a melhor entender as leis de Deus, em consonância com Allan Kardec, tais como: Zilda Gama, Yvonne Pereira, Chico Xavier e Divaldo Franco, entre outros, surgem médiuns a veicular doutrinas e opiniões personalíssimas da lavra de pretensos sábios Espíritos. Passamos, então, a citar, estudar e divulgar os verdadeiros falsos Cristos, exatamente aqueles que, no passado, tanto nos recomendaram não seguir.
Alguns diriam que o aparecimento de tanta literatura falsa, seria o último ataque dos Espíritos perturbadores. Mas, a responsabilidade pela implantação desta realidade caberia exclusivamente a esses Espíritos embusteiros e seus fascinados médiuns que, em um verdadeiro conluio, trazem as suas propostas estranhas? Não nos caberia também uma parcela na formação desta realidade?
Há um princípio econômico estabelecendo que a oferta seja proporcional à procura, visto que, se não há procura, não há oferta. Talvez, seja este um dos mecanismos dominantes no fato aqui em exame. Procuram-se avidamente as luzes bruxuleantes das falsas doutrinas, para “autoiluminação” e ”autoajuda”, tais quais mariposas desavisadas, em busca da luz artificial. Será que as bases doutrinárias, que representam a luz verdadeira, precisariam se adequar a novos padrões, a novas teorias? – A razão não o confirma, impondo-se, portanto, a necessidade de se voltar urgentemente ao estudo metódico dos livros da Codificação.
O estudo de O livro dos médiuns tem sido frequentemente preterido por literaturas quase infantis em suas propostas, que não resistem à mais leve análise doutrinária. Contudo, estas literaturas têm feito seguidores e divulgadores ferrenhos que, ao deixarem de estudar o guia sobre mediunidade, ficam expostos a toda sorte de ataques. Desta forma, na primeira novidade de um mistificador, devido ao despreparo e desconhecimento da base doutrinária, aceitam-na e passam a difundi-la como se fosse a mais pura verdade.
Alguns chegam mesmo a defender a venda de livros sabidamente pseudoespíritas, considerando fatores econômicos. Será que os fins justificariam os meios? Certamente, Allan Kardec, o bom senso encarnado, não aprovaria tal procedimento.
Contudo, como distinguir a verdadeira da falsa doutrina? Certamente, não seria observando os índices para Catálogo Sistemático, que constam na contracapa dos livros, visto que o autor e seu editor, quando não são os mesmos, ali colocam o que desejam, e se o autor é um falso profeta, que tenciona adulterar a Doutrina, obviamente informará que o livro trata de Espiritismo.
Argumenta-se ser perfeitamente possível distinguir o que é bom do que é ruim dentro da literatura apócrifa, que é possível separar o joio do trigo, por isso, citam-se, estudam-se e divulgam-se livros não espíritas, como se o fossem. Paulo já nos advertiu: Tudo me é permitido, mas nem tudo convém (1 Coríntios, 6:12).
Assim, se desejamos estudar a pseudoliteratura espírita, no exercício de nossa liberdade, estudemos, mas não divulguemos nem dela façamos apologia, pois outras pessoas, sob nossa influência, virão a estudá-la também e, sem possuírem a base doutrinária que nelas supomos existir, certamente cairão, desavisadas, nas armadilhas dos lobos travestidos em pele de cordeiro. Aí está a grave responsabilidade que cria para si mesmo quem divulga teorias absurdas.
Em O evangelho segundo o espiritismo Erasto, discípulo de Paulo, se preocupou mais uma vez em nos alertar sobre os falsos Cristos: Desconfiai, pois, dos falsos profetas, máxime numa época de renovação, qual a presente, porque muitos impostores se dirão enviados de Deus. Eles procuram satisfazer na Terra à sua vaidade […].1
E mais: Os falsos profetas não se encontram unicamente entre os encarnados. Há-os também, e em muito maior número, entre os Espíritos orgulhosos […]. E, para melhor fascinarem aqueles a quem desejam iludir, para darem mais peso às suas teorias, se apropriam sem escrúpulo de nomes que só com muito respeito os homens pronunciam.2
Revisitemos Allan Kardec: […] o Espiritismo sério patrocina com satisfação e zelo toda obra feita em boas condições […] mas, por outro lado, repudia todas as publicações excêntricas. Todos os espíritas que se empenham para que a Doutrina não seja comprometida devem, pois, esforçar-se para as condenar […].3
Tal foi a preocupação de Erasto, ao sintetizar a questão na frase: Melhor é repelir dez verdades do que admitir uma única falsidade, uma só teoria errônea.4
Contudo, nos parece que, atualmente, esta máxima também poderia ser assim escrita: melhor é não divulgar dez verdades do que divulgar uma única falsidade, uma só teoria errônea.
1KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Cap. 21, it. 9.
2 ______.______. it.10.
3 ______. Viagem Espírita em 1862 e outras viagens de Kardec. Instruções Particulares dadas aos grupos em resposta a algumas das questões propostas – VI.
4 ______, O Livro dos Médiuns. Cap. XX. it. 230.