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terça-feira 26 novembro 2024
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Coluna Espírita – Algumas notas sobre a salvação

• Rogério Miguez – São José dos Campos/SP
Dentro do contexto religioso sempre houve preocupação sobre a salvação. Há inúmeras citações na Bíblia sobre o tema, contudo, assim acreditamos, bem poucos sabem: como de fato salvar-se ou mesmo por que salvar-se?
Se é verdade que a salvação é incerta, precisamos descobrir como a conquistaremos. E mais, se existe a possibilidade de não nos salvarmos, é possível imaginar alguns sendo salvos enquanto outros não, desta forma, haverá integrantes dentre as famílias que serão separados definitivamente pela eternidade afora, proposta pouco alentadora.
Talvez a questão primeira a nos debruçarmos seja ajuizar se há salvação, pois desta decorrem outras: como, do que, para que salvar-se?
A interpretação espírita da salvação existe, e é voltada a orientar o Espírito a bem se conduzir na vida, do ponto de vista ético e moral. Não obtendo sucesso nesta empreitada, o Espírito colherá os frutos amargos de suas escolhas, passando por sofrimentos e apreensões intermináveis, do seu ponto de vista.
Entretanto, este conceito espírita não se baseia no entendimento do inferno ou do céu segundo tradições religiosas, porquanto, o inferno e o céu podem realmente existir, porém, dentro de cada um de nós, em função de como vivemos, não contemplando a existência de um local no Universo onde todos os condenados seriam enviados, sem direito a de lá sair, e por oposição, outra localidade onde todos os salvos permaneceriam, convivendo com Deus.
A salvação espírita ocorre quando o Espírito observa os preceitos morais contidos nas leis divinas, assim agindo, não haverá temor no pós-morte, tampouco vergonha, inquietação nem ranger de dentes. Mesmo se o Espírito não seguir na totalidade os mandamentos morais, ele não será irremediavelmente condenado, sofrerá as temporárias consequências, voltará e prosseguirá a sua jornada.
A propósito, na nossa faixa evolutiva, não há qualquer Espírito em condições de observar rigorosamente todos os preceitos morais de forma continuada, só Espíritos de elevadíssima evolução podem fazê-lo, assim, todos nós ainda oscilaremos entre o cumprimento e o descumprimento dos deveres morais, uns mais, outros menos.
Como visto, ninguém se perderá definitivamente, todos alcançarão uma relativa perfeição, contudo, este trilhar será diverso, uns chegando à meta primeiro, outros mais tarde, mesmo considerando dois Espíritos criados ao mesmo tempo, pois cada qual acertará ou errará de modo diferente. Os sucessos e insucessos da jornada determinarão o tempo necessário para se conquistar a condição de Espírito puro. Conclui-se ser esta proposta eminentemente consoladora.
Não há destinação perpétua de sofrimento. No Novo Testamento há pelo menos duas passagens opondo-se à base de sustentação do conceito de inferno eterno, e foi Jesus quem as ditou:
1. Eu te digo, não sairás de lá antes de pagares o último centavo1. Confirma sermos nós mesmos a quitar as nossas próprias dívidas, e também ser perfeita a justiça divina, permitindo ao devedor pagar integralmente o seu débito. Observa-se ainda nessa afirmação a certeza de que, ao quitarmos o último centavo, estaremos livres das obrigações a pagar, derrubando por completo a tese das penas eternas e, quanto mais rápido pagarmos, mais rápido sairemos da “prisão”;
2. Que vos parece? Se um homem possui cem ovelhas e uma delas se extravia, não deixa ele as noventa e nove nos montes e vai à procura da extraviada? Se consegue achá-la, em verdade vos digo, terá maior alegria com ela do que com as noventa e nove que não se extraviaram. Assim, também, não é da vontade de vosso Pai, que está nos céus, que um destes pequeninos se perca2. Ora, se nenhuma ovelha se desencaminhará para a perdição eterna, não há também como imaginar um local ou região de sofrimentos perpétuos, abrigando todos os faltosos que não quitaram as suas respectivas dívidas. Ressalta também deste ensino não haver falta irremissível, ou seja, não existem pecados capitais.
Esclarece ainda a Doutrina sobre a existência de um mecanismo sábio e justo viabilizando a caminhada para a salvação: a reencarnação. Ou seja, viveremos em mundos materiais até não existir mais nenhum resgate, e, após estas muitas vidas encarnados, só reencarnaremos em missões significativas em prol do progresso da Humanidade. Esta lei dá plena sustentação à afirmação de Jesus: todas as ovelhas serão salvas, sem exceção.
Por outro lado, a salvação espírita não nos conduzirá a um céu de contemplação, onde passaremos a eternidade escutando melodiosas harpas e saboreando frutas frescas ao lado do Criador, esta concepção é infantil, nos salvaremos para trabalhar mais junto ao Pai.
Por último, fazemos menção a um texto do Dr. Bezerra de Menezes:
O espírita cristão é chamado aos problemas do mundo, a fim de ajudar-lhes a solução; contudo, para atender em semelhante mister, há que silenciar discórdia e censura e alongar entendimento e serviço.
É por essa razão que, interpretando o conceito “salvar” por “livrar da ruína” ou “preservar do perigo”, colocou Allan Kardec, no luminoso portal da Doutrina Espírita, a sua legenda inesquecível:
– “Fora da caridade não há salvação.” 3
Sim, fazemos coro com o Médico dos Pobres, a caridade bem observada e principalmente praticada, equivale a viver ética e moralmente conforme as leis de Deus.
Estas são as quatro questões fundamentais:
1. Há salvação? – Sim, não há dúvida.
2. Como promovo a salvação? – Vivendo continuadamente conforme as leis de Deus.
3. Do que desejo me salvar? – Da ruína moral, preservando-me do perigo.
4. Por que quero me salvar? – Para trabalhar ativamente na grandiosa obra divina!
1 BÍBLIA DE JERUSALÉM. Trad. Gilberto da Silva Gorgulho et al. [8.imp.] Paulus Editora. Mateus 12: 59.
2 _____,_____. Mateus 18: 12-14.
3 XAVIER, Francisco C., VIEIRA, Waldo. O Espírito da Verdade. Autores diversos. FEB Editora. cap. 3 – Legenda espírita.