Revisitar obras clássicas pode ser cruel em muitas situações. A comparação com a original e demais versões é sempre inevitável. Quando se trata, então, de um filme tão lembrado de 1990, que fez parte da infância de toda uma geração, a missão só complica. Felizmente, para a nova adaptação do livro de Roald Dahl temos a produção de Alfonso Cuarón, roteiro de Guillermo Del Toro e direção do incrível Robert Zemeckis. Não há maneiras de dar errado, não é mesmo?
De volta para o passado, nos já longínquos anos 90, a primeira adaptação de Convenção das Bruxas era tão soturna quanto seu material original. Muitas crianças foram apavoradas pela produção, que eternizou Anjelica Huston como a grande bruxa, tenebrosa, em nossas memórias. Ainda que fosse uma fábula infantil, a obra precisava desse pavor gráfico para atingir o ponto que queria e manter a atenção de seu público. E mesmo tendo alterado o final original do livro, o filme atingia o choque necessário para justificar a mudança que trazia mais esperança para o desfecho.
Passados 30 anos, uma nova adaptação (e não um remake) traz um frescor à história. Tirando a trama inglesa de seu habitat natural e levando para os anos 60, nos EUA, o novo Convenção das Bruxas, ainda que seja, narrativamente, o mesmo que conhecemos, toma a liberdade para agregar outras discussões e muda sua essência. A época e local escolhidos para se passar juntamente com a opção pela família protagonista negra é uma ótima sacada. A maquiagem das bruxas aliada a computação gráfica disponível hoje também é fato que possibilita expandir os caminhos já traçados. Até a preferência pela maior fidelidade ao final mais literal, da obra original, mostra a tentativa da produção em se descolar do que já vimos. O que sabemos, porém, é que de boas ideias (e intenções) o limbo de filmes medíocres está cheio. E tudo isso acabou sendo uma cilada para Robert Zemeckis.
Por algum motivo o roteiro dessa versão resolveu tratar seu público como seres incapazes de fazer associações por si próprios, ou incapazes de pensar sem ajuda. O personagem principal, além de não expressar qualquer emoção, tem a necessidade de narrar todos os acontecimentos. As resoluções são risíveis de tão simplificadas e as problemáticas nunca são problemas reais. E o argumento que insiste em justificar dizendo se tratar de um filme para crianças nem tem validade aqui, já que estamos acostumados a grandiosas obras infantis cheias de subtexto e inteligência (vide Pixar). Sem explorar o problema racial implícito, sem explorar propriamente as bruxas e sem carisma com os protagonistas, pouco resta para investirmos qualquer sentimento. Até Octavia Spencer, ótima atriz, parece um tanto perdida em cenas que precisa interagir com os ratinhos de computação gráfica.
É possível enxergar um esforço de Zemeckis. O diretor sabe filmar como poucos e deixa isso claro em seus movimentos de câmera e enquadramentos, que exaltam o belo design de produção e fotografia competente. Uma pena que filmar bem não signifique ter algo bom a ser filmado, porém. A famigerada cena de transformação das bruxas é um ponto alto. Apesar de passar longe da clássica, é divertida e merece atenção. A grande bruxa de Anne Hathaway é caricata e bem exagerada, o que, de certa forma, até combina com o tom perdido do longa.
Provando que nomes de peso e boa vontade não são as únicas engrenagens para um bom filme, Convenção das Bruxas não tem inspiração, não empolga e não ultrapassa o patamar de filme mediano e esquecível. Sendo assim, naufraga em suas ideias, não tem qualquer peso emocional para justificar o final retirado da obra literal e, definitivamente, não marcará toda uma geração como seu antecessor.
Por Giuseppe Turchetti