No dia 25 de março de 1824 era outorgada pelo Imperador Pedro I a Constituição Imperial
O Brasil foi a única colônia sul-americana a adotar a monarquia como regime de governo após sua independência. Com o plano de se tornar um legítimo Estado ocidental, partindo das características que estruturavam as monarquias europeias, em 3 de maio de 1823 foi instaurada uma assembleia constituinte para definir a base legal do Estado moderno brasileiro.
Desde o início essa iniciativa desencadeou situações de conflito intenso entre liberais e conservadores. Pedro I, com a fama positiva de ter deserdado da tradição dos Bragança e assumido a autonomia política do Brasil contra o império do pai, esclarece um seu discurso inaugural da instituição suas expectativas em relação à nova Constituição.
Em contraponto aos liberais ilustrados, que visavam uma monarquia constitucional em que o imperador tivesse somente poderes simbólicos e representativos, Pedro I coloca de frente sua intenção de legitimar por lei seu poder de veto e o controle concentrado sobre as instituições. É claro que isso gerou intriga.
Em 12 de novembro de 1823, o jogo vira: no evento que ficou conhecido como “Noite da Agonia”, o Imperador ordena que as suas forças militares invadam a assembleia, prendendo diversos opositores políticos. Pedro I assim dissolve o órgão e a recria sob novos moldes, num esquema muito mais próximo a ele. Dez cidadãos luso-brasileiros, ligados aos interesses da alta burocracia nacional e ao Partido Português e aliados do imperador, são convocados na elaboração da nova carta, agora tendo Pedro I como administrador de todo o processo.
Fechados à qualquer manifestação ou contato, o novo conselho constituinte redige a nova constituição e entrega nas mãos do Imperador Pedro I, que a outorga oficialmente no dia 25 de março de 1824, declarada nova lei máxima do Estado brasileiro.
A nova carta dava poderes simbólicos e políticos bastante relevantes ao imperador. O documento declara que o Brasil era uma monarquia constitucional hereditária, comandada pela dinastia da casa de Bragança. O Imperador, junto à Assembleia Geral, representava a Nação. Declara-se o Imperador inimputável, ou seja, sua ação responde a seu cargo, não à sua pessoa, o que significa a inviabilidade legal do rei de responder pelos seus atos, blindando-o de processos do judiciário. Por último, é institucionalizado um quarto poder nacional, conhecido como Poder Moderador. Segundo essa cláusula, o Imperador (e somente ele) possui plenos poderes de veto e intervenção acima dos outros três poderes, concentrando muito poder em sua mão e delegando-o Chefe Supremo e Primeiro Representante da Nação brasileira, posição em que o rei, supostamente, “incessantemente vele sobre a manutenção da independência, equilíbrio e harmonia dos mais Poderes políticos” (Artigo 98 da Constituição).
Essa constituição é um interessante documento da formação do Estado brasileiro. Leva nele as marcas relevantes de uma constituição liberal e parlamentarista, mas cria ao mesmo tempo um poder concentrado nas mãos do poder executivo e do rei. Traz uma proposta inicial associada ao liberalismo europeu imperial, ao mesmo tempo em que é minuciosamente redigida para enquadrar a legalidade da escravidão, que vai durar até o fim do Império.
Pedro I, que como Pedro IV de Portugal será conhecido como libertador ilustrado, no Brasil deixa uma forte marca de autoritarismo vertical, com traços de despotismo, a ponto de abdicar ao trono anos depois.
A Constituição de 1824 foi a mais duradoura até agora na História do Brasil, rendendo 65 anos de governo sob os critérios de uma carta outorgada pela intervenção imperial da assembleia, fazendo equilibrar artificialmente a relação conflituosa entre uma instituição liberal e a prática da própria tradição servil — ela só foi revogada com a proclamação da República no dia 15 de novembro de 1889. Mas a nova constituição só foi publicada em 1891.